A MULHER VÍTIMA DE VIOLÊNCIA DOMPESTICA PODE RETIRAR A QUEIXA OU RENUNCIAR AO PROCESSO CRIMINAL CONTRA COMPANHEIRO AGRESSOR?

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As relações familiares desde há muito que são complexas. Quem está de fora, tem sempre uma solução rápida!

O homem te bateu? Um abraço! A fila anda. Parte pra outra. Larga de ser besta, vai ficar sofrendo até quando? Simples e rápido, é dar conselho para os problemas dos outros, mas sabemos que não é assim que funciona a solução da violência doméstica, bem como o término de relacionamentos.

Longe de nós defendermos que qualquer mulher permaneça com agressor! Pelo contrário, não incentivamos isso, reprovamos. Mas sabemos que o contexto de cada casal é um universo complexo que não é resolvido só com um palpite de quem está de fora.

Dito isso, adentramos o assunto da violência que chega ao conhecimento das autoridades, e no mesmo dia, creiam, ou no outro, a mulher vítima da violência doméstica já muda o posicionamento e quer retirar a queixa contra o agressor, dispensando inclusive as medidas protetivas outrora concedidas.

Esse desejo da vítima ocorre por vários fatores que discorremos um pouco sobre ele. Esse artigo é simples, diante da gigante complexidade que é a violência doméstica que envolve a Psicologia, filosofia, Assistência Social, Sociologia, o Direito e outra gama gigante de ciências para tratar o tema.

A mulher vítima de violência doméstica quer retirar a queixa ou denúncia criminal contra o companheiro agressor por amor. Ela não quer perder o companheiro, apesar dos pesares.

Outras vezes por ser dependente econômica. Ele é o provedor do lar, ela com seus filhos não tem pra onde ir. Situação muito grave de cunho social.

Há casos de vingança! Sim, mulheres que querendo se vingar do companheiro, provocam brigas, ou mesmo, realizam a falsa denunciação contra o companheiro no intuito de prejudicar sua imagem.

É também por temor social. Muitas mulheres não querem ser vistas como divorciadas, tem medo da solidão, não tem uma perspectiva futura quanto a outro relacionamento e vão perpetuando a relação já doentia.

Em alguns casos, a mulher vítima de violência doméstica participou seja com provocação, seja com agressão e no revide, ou na legítima defesa foi também machucada.

Imaginem a situação, a mulher foi agredir o marido, e ele ao segura-la com força, tentando se defender acaba por deixar marcas em seus braços, quando essa mulher chega na delegacia de mulheres, registra a ocorrência, faz o exame de corpo de delito e são constatados hematomas, o que acha que vai ocorrer? Claro que houve violência, ainda que tenha sido em legítima defesa do suposto agressor. E quem você acha que terá razão na delegacia de mulheres?

Muitas mulheres tem um ou vários desses fatores, ou mesmo, até a questão religiosa afeta a decisão, ou seja, ele prefere o perdão! Entende ser necessário perdoar. E que o divórcio não está nos planos de Deus.

Apresentados esses fatores, passamos então a verificar a questão central, é possível a mulher vitima de violência doméstica retirar a queixa contra o companheiro agressor?

Sim, é possível, mas não é simples de ser feito. Vamos explicar porque.

Há um tempo atrás, era feita a queixa na delegacia, decretavam-se as medidas protetivas, abria-se o inquérito e logo após, a vítima da violência doméstica ia até a delegacia e pedia para retirar a queixa que não havia mais interesse em seu prosseguimento. E era retirada a queixa. Ou mesmo, se dirigia à escrivaninha da vara ou juizado da violência e fazia lá mesmo sua renúncia.

Bom, mas isso, ficou no passado. A legislação se aperfeiçoou e não permitiu tal coisa, e por que? Simples, para que a mulher vítima da violência doméstica não fosse coagida pelo agressor a retirar a queixa de forma tão simples.

Que fique bem claro, hoje é impossível retirar a queixa, seja na delegacia, ou no cartório da vara ou juizado da violência doméstica, sem uma audiência específica para isso.

Então quer dizer que a mulher vítima da violência doméstica não pode retirar a denúncia ou queixa para que não continue o processo contra o agressor? Claro que pode, mas deve-se observar algumas situações bem destacadas na Lei Maria da Penha, LEI Nº 11.340, DE 7 DE AGOSTO DE 2006, em seu artigo 16, que transcrevo aqui:

Art. 16. Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de que trata esta Lei, só será admitida a renúncia à representação perante o juiz, em audiência especialmente designada com tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público.

Esse artigo traz em sua interpretação algumas observações que passamos a fazê-las no intuito de esclarecer ao leitor sobre o procedimento para frear o processo criminal em desfavor do agressor de violência doméstica.

  1. Requerer audiência específica para tal fim.

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É necessário que a vítima de violência doméstica, através de seu defensor constituído, peticione no processo de violência doméstica o requerimento de designação para audiência de retratação/justificação, momento em que poderá retirar a queixa, ou seja, renunciar ao processo.

Essa audiência é específica para esse fim, não tem haver com conciliação, instrução e julgamento, e sequer haverá a presença do acusado, somente da vítima, seu defensor, juiz e promotor.

O juiz ao observar os fatos, e o pedido da vítima avaliará a possibilidade de renúncia ao processo, após parecer ministerial, quer dizer, ouvida o que o Ministério Público tem a dizer.

  1. O prazo para fazer o pedido para essa audiência.

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A Lei também deixa claro qual é o prazo para requerer audiência de retratação, que é antes do recebimento da denúncia. Funciona assim, é aberto o inquérito, enviado ao Ministério público pela delegacia, que irá ou não oferecer denúncia contra o acusado, observando se há materialidade e indícios de autoria.

Feito isso, o Ministério Público oferece ou não denúncia contra o acusado, esse processo então volta para a vara ou juizado, e lá o juiz observará o inquérito e a denúncia e decide se a recebe ou não, se não receber, arquiva, se receber iniciou o processo. É nesse meio tempo, entre a denúncia e o recebimento que pode ser feito o pedido.

Mas talvez você esteja se perguntando, perdi esse prazo será possível ainda requerer essa audiência? Em nosso entendimento sim. É preciso tentar, pois esse prazo pode ser alvo de mitigação, ou seja, o juízo do caso pode aceitar por diversos fatores realizar essa audiência.

  1. Somente para ações penais condicionadas à representação.

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No Direito Penal, existem algumas peculiaridades, um exemplo é a tal ação condicionada ou incondicionada. De forma simples, uma ação condicionada à representação é aquela que fica a critério do ofendido representar contra o ofensor, exemplo, quando são cometidos os crimes de injúria, calúnia, difamação, os chamados crimes de menor potencial ofensivo.

Já as ações incondicionadas à representação da vítima, são aquelas que o Ministério Público é titular, quer dizer, basta que a autoridade tenha conhecimento do crime, e ele irá prosseguir, independente de representação ou não, como exemplos temos, Lesão corporal, ainda que leve, feminicídio, furto, roubo, etc.

Portanto, se o crime cometido no âmbito da violência doméstica ocorreu um desses crimes que são de representação da vítima, poderão, ser retirados em audiência específica para isso. Caso tenha ocorrido crime de lesão corporal, não poderá ser renunciado o processo.

Caso tenha ocorrido, um crime de natureza incondicionada não há mais como fazer a retratação? Em tese não! Mas em todo caso, deve ser analisada a situação, pois, a narrativa da vítima pode deixar claro que a lesão corporal que ocorreu, foi em legítima defesa do suposto agressor, e caso o juízo não aceite realizar a audiência de justificação, na audiência de instrução isso pode ser esclarecido. Vale sempre à pena tentar.

Em considerações finais, deixamos claro que:

  1. A) É POSSÍVEL a mulher vítima de violência doméstica retirar a queixa ou renunciar ao processo criminal contra o companheiro agressor. Observados os requisitos tratados nesse texto.
  1. B) É IMPOSSÍVEL a mulher vítima de violência doméstica retirar a queixa ou renunciar ao processo criminal contra o companheiro agressor, seja na delegacia, seja na escrivaninha da vara ou juizado da violência doméstica contra a mulher apenas indo lá pedir para retirar.
  1. C) É obrigatório realizar AUDIÊNCIA DE JUSTIFICAÇÃO/RETRATAÇÃO, presentes vítima, juiz e promotor para a mulher vítima de violência doméstica retirar ou renunciar o processo criminal contra o companheiro agressor.
  1. D) É POSSÍVEL a mulher vítima de violência doméstica retirar a queixa ou renunciar ao processo criminal contra o companheiro agressor, apenas quando os crimes cometidos no âmbito da violência doméstica forem de natureza condicionada à representação da vítima.

Esse mecanismo visa proteger a vítima de violência doméstica ao mesmo tempo acabar com a banalização do uso da justiça como vingança, espetáculo, ameaça, seja o intuito errado que for.

Trazendo assim, mais segurança para a vítima de violência doméstica, e o correto e respeitoso uso da máquina judiciária.

Em todo caso, consulte sempre um advogado especialista para que seja tomada a decisão correta, seja você vítima, agressor ou ambos e faça uso dos meios que a Lei permite para trazer solução ao conflito.

 

Dr. Rafael Rocha

OAB/GO 33675

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