TRANCAMENTO DE AÇÃO PENAL POR MEIO DE HABEAS CORPUS. O ENTENDIMENTO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
Enfrentar uma ação penal é tão doloroso, que em determinados casos, já serviria como pena. E as vezes o trâmite é até mais demorado que o cumprimento da condenação.
Imagine, custos com honorários de advogado, seu nome no distribuidor criminal, a incerteza quanto ao resultado, enfrentar fóruns, audiências, perícias, juízes, promotores, serventuários, reunião com a defesa, é um desgaste emocional, físico e espiritual.
Agora o pior de tudo isso é quando o que estão alegando em seu desfavor não é sequer crime. Chamamos de fato atípico, aí é pior ainda.
Ocorre que até por desacordos comerciais, questões puramente cíveis, são abertos inquéritos na delegacia sob a falsa acusação de estelionato ou apropriação indébita, e chegam até a ofertar a denúncia.
Só relembrando, o Direito Penal é a útima ratio. Isso quer dizer, a última razão, o último recurso. Não é para ser usado à torta e à direita, como é tão banalizado, com falsas denunciações que são feitas por aí.
Dito isso, há uma solução utilizada pela defesa para evitar que um inquérito se transforme em uma ação penal, ou mesmo dar fim ao inquérito, que é o TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. Sobre esse tema eu já escrevi um artigo completo e detalhado que você pode ler aqui
Trancar uma ação penal ou inquérito policial é requerer com pedido liminar à autoridade judiciária que pare e feche o andamento daquele feito, seja ação em curso ou apenas o inquérito.
Em geral é protocolado um Habeas Corpus requerendo o trancamento da ação penal ou inquérito Policial.
Ocorre que isso não é tão simples. Como nada no Direito e na justiça é simples, pelo contrário, é dificílimo alcançar esse resultado e ao vencer pode comemorar, pois não é fácil.
Recentemente o Ministro Luís Barroso, do Supremo Tribunal Federal enfrentou a questão no HC 180869 AgRm e reafirmou a visão/entendimento do STF sobre trancamento de ação penal por via de Habeas Corpus.
E é sobre esse entendimento que vou falar nesse texto. Caso tenha interesse nesse assunto, continue comigo que você vai conhecer qual é o entendimento do STF sobre trancamento de ação penal por meio de habeas corpus.
Assim, foi aberto o voto do Ministro Luís Roberto Barroso.
“A orientação jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal é no sentido de que o trancamento da ação penal, por meio do habeas corpus, só é possível quando estiverem comprovadas, de plano, a atipicidade da conduta, a extinção da punibilidade ou a evidente ausência de justa causa. Precedentes”.
A Ementa ficou da seguinte forma:
EMENTA: PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. CRIMES CONTRA A HONRA. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES. 1. A orientação jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal é no sentido de que o trancamento da ação penal, por meio do habeas corpus, só é possível quando estiverem comprovadas, de plano, a atipicidade da conduta, a extinção da punibilidade ou a evidente ausência de justa causa. Precedentes. 2. Na concreta situação dos autos, não é possível infirmar, de plano, os fundamentos adotados pelas instâncias de origem para reconhecer a atipicidade da conduta e a inépcia da queixa-crime. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. HC 180869 AgRm.
Vou explicar cada um dos requisitos exigidos pelo STF, para que uma ação penal seja trancada, trazendo melhor esclarecimento aos leitores que não são da área do Direito.
1. atipicidade da conduta
A atipicidade nada mais é que ausência de tipicidade. Não havendo tipicidade, inexiste fato típico e, consequentemente, não há crime, devendo o réu ser absolvido (art. 386, III, do Código de Processo Penal).
É o mesmo que dizer que o fato descrito não é tido como crime no Brasil, isso é então um fato atípico, pois não foi tipificado como crime pelo legislador.
Trata-se de uma questão de suma importância, que caso não tenha sido alegada como fato de trancamento da ação penal, deve o juiz ao entender a atipicidade prolatar sentença absolutória.
Art. 386. O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça:
III – não constituir o fato infração penal;
2. extinção da punibilidade
A extinção da punibilidade é a perda do direito do Estado de punir o agente autor de fato típico e ilícito, ou seja, é a perda do direito de impor sanção penal. As causas de extinção da punibilidade estão espalhadas no ordenamento jurídico brasileiro.
Do que se vê, não é apenas o artigo 107 do Código Penal que trata da matéria.
Art. 107 – Extingue-se a punibilidade:
I – pela morte do agente; II – pela anistia, graça ou indulto; III – pela retroatividade de lei que não mais considera o fato como criminoso;
IV – pela prescrição, decadência ou perempção;
V – pela renúncia do direito de queixa ou pelo perdão aceito, nos crimes de ação privada;
(…) IX – pelo perdão judicial, nos casos previstos em lei.
Como exemplos de causas de extinção da punibilidade fora do artigo 107 , CP , é possível citar o artigo 312 , parágrafo 3º , CP e a Lei 9.099 /95, que trata dos institutos da transação penal e da suspensão condicional do processo.
3. evidente ausência de justa causa
A falta de justa causa pode ser não materialidade, ou seja, falta de provas do ocorrido, e falta de indícios de autoria. Não se tem o crime, e ou não se tem o autor certo.
A questão da justa causa se firma no lastro probatório, sem provas, sem condições, não bastam meras alegações do MP, ou do querelante.
Assim, diferentemente do que ocorre no processo civil, no processo penal o Ministério Público não pode oferecer denúncia de forma abstrata contra qualquer indivíduo. Pelo contrário, exige-se a apresentação de elementos mínimos de informação, ou seja, o direito de ação não pode ser exercido sem uma base sólida. É preciso, portanto, investigar e colher elementos mínimos para depois denunciar.
E não esqueçamos o “de plano”.
Bem, aqui estamos diante do abismo jurídico, da insegurança, da altíssima subjetividade. O que é “ de plano”? por óbvio que sei a resposta, trata-se de algo claro, fácil de identificar.
O problema é que o que é de plano para um juiz não é para o ministro, não é a mesma visão para todos. Ainda mais se levarmos em consideração que quem faz o voto não é o próprio magistrado, mas um assistente. E aí, dá-lhe entendimentos.
Cada processo precisa de uma verificação minuciosa, não é possível julgar a toque de caixa, sem observar as peculiaridades, mas diante de milhares e milhares de processos, sei que é humanamente impossível.
E em nossa visão é aí que surge o bom profissional da advocacia, que fará de tudo para que o julgador conheça os detalhes da demanda.
Bom, diante de tudo que foi dito a visão do STF sobre a possibilidade de trancamento de ação penal por meio de Habeas Corpus, é que o trancamento da ação penal, por meio do habeas corpus, só é possível quando estiverem comprovadas, de plano, a atipicidade da conduta, a extinção da punibilidade ou a evidente ausência de justa causa (HC 103.891, Redator para o acórdão o Ministro Ricardo Lewandowski; HC 86.656, Rel. Min. Ayres Britto; HC 81.648, Rel. Min. Ilmar Galvão; HC 118.066-AgR, Relª. Minª. Rosa Weber; e HC 104.267, Rel. Min. Luiz Fux).
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Em todo caso, consulte sempre um advogado.
Dr. Rafael Rocha