Quem Financiou imóvel com Banco, antes de 2009, pode ter Direito a Diminuição das Parcelas ou Restituição de Valores
Estamos vivendo em um período muito complicado por causa da pandemia do novo coronavírus, fato que aprofundou a crise econômica que o Brasil passa.
Diante das incertezas da economia, diminuição de renda e demissões, pessoas que compraram imóveis financiados com instituições financeiras estão com dificuldades para pagar as parcelas do contrato.
Boa parte desses compradores não sabem que podem estar pagando um valor muito acima do devido.
E é bem provável que você tenha direito de pagar menos no seu contrato de financiamento imobiliário vinculado ao Sistema Financeiro de Habitação, feito com um banco, se esse contrato tiver sido assinado até o dia 07.07.2009.
E se você já tiver quitado esse contrato, é possível pedir a restituição dos valores pagos a maior, que podem chegar na casa dos milhões de reais.
Veja algumas das abusividades desses contratos:
Capitalização de juros
Capitalização de juros é a cobrança de juros sobre os próprios juros, também conhecido como anatocismo. É chamada capitalização de juros porque é a ação de tornar os juros em capital.
E é proibida a capitalização de juros em qualquer periodicidade, nos contratos celebrados no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação antes de 07.07.2009, como decidido pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), no REsp 1070297/PR, julgado sob o rito dos recursos repetitivo.
A capitalização dos juros faz com que o valor cobrado pelos bancos, nesse tipo de contrato, dobre ou triplique o valor original da dívida.
Uso indevido da Tabela Price
Antes de 07.07.2009, os bancos, qualquer um deles (Caixa Econômica Federal, Banco Itaú, Banco Bradesco, Bando do Brasil, HSBC), não podiam usar da Tabela Price, que é um método de amortização do saldo devedor que capitaliza os juros.
O uso da Tabela Price faz com que os juros sejam contados de forma composta, incidindo todos os meses, tanto na parcela como no saldo devedor, é a capitalização mensal de juros.
E antes de 07 de setembro de 2009, não havia lei que autorizasse os bancos a fazer esse tipo de cobrança nos contratos de financiamento vinculados ao Sistema Financeiro da Habitação.
Veja como a justiça decidiu um processo de um consumidor que adquiriu um imóvel, em 1989, onde havia a capitalização de juros e uso da Tabela Price, além de outras ilegalidades:
EMENTA: Duplo Apelo. Ação revisional contratual e do saldo devedor c/c repetição de indébito com restituição de quantia paga c/c declaratória de nulidade de cláusulas abusivas com pedido liminar de tutela antecipatória.
I – Contrato no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação. Aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor. Possibilidade. Nos casos em que há flagrante abusividade das taxas de juros e de outros encargos nos contratos no âmbito do sistema financeiro da habitação, em razão do que dispõe o CDC, deve o Poder Judiciário intervir a fim de adequar as obrigações convencionadas entre as partes, para evitar vantagem exagerada ou abusividade, não caracterizando a atuação judiciária ofensa ao pacta sunt servanda.
II – Capitalização dos juros e tabela price. Impossibilidade. Contrato firmado antes da Lei 11.977/2009. É vedada a capitalização de juros em qualquer periodicidade nos contratos pactuados no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação antes da vigência da Lei nº 11.977/2009. No caso em comento, tendo em vista que a tabela price reflete a incidência de juros compostos, deve ser afastada.
III – Comissão de permanência. Possibilidade. Cumulação com outros encargos. Impossibilidade. Recurso repetitivo (REsp nº 1.058.114/RS). Súmula nº 472 do STJ. É legítima a incidência isolada da comissão de permanência no período de anormalidade no contrato em questão, excluindo-se, porém, os demais encargos moratórios.
IV – Repetição do indébito em dobro. Impossibilidade. Face ao reconhecimento de abusividade de alguns encargos, a repetição de indébito é medida impositiva. Neste contexto, não obstante preveja o artigo 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, a restituição em dobro da quantia indevidamente cobrada, o entendimento da colenda Corte Superior e deste egrégio Tribunal de Justiça é de que, em casos como o em debate, a repetição do indébito deve se dar de forma simples, pois a restituição em dobro só tem cabimento quando demonstrada a má-fé do credor, que não se vislumbra na hipótese em espeque.
V – Sucumbência Recíproca. Se cada litigante for em parte vencedor e vencido, deverão responder proporcionalmente pelas despesas processuais e honorários advocatícios, nos termos do art. 86, do CPC. VI – Honorários advocatícios. Fixação sobre o valor do proveito econômico. Nos termos do artigo 85, §2º, incisos I a IV do CPC, os honorários advocatícios deverão ser fixados entre o mínimo de 10% e máximo de 20% sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa. No caso em debate, a verba advocatícia devida pela parte ré ao causídico da parte autora deve ser arbitrada em 10% sobre o proveito econômico obtido pela parte autora, nos termos do artigo 85, §2º, incisos I a IV do CPC. Dada a sucumbência recíproca, deverá a parte autora/2ª apelante pagar ao patrono do banco réu/1º apelante honorários advocatícios sucumbenciais fixados em R$ 1.500,00 (um mil e quinhentos reais), pois irrisório seria o valor se arbitrado em percentual sobre o valor da causa. Apelações Cíveis conhecidas e parcialmente providas.
Depois dessa data é permitida a capitalização de juros e uso da Tabela Price, porque a Lei nº 11.977/2009 autorizou isso.
Os contratos anteriores, entretanto, não podem ter esse tipo de cobrança, que faz com que o valor a ser pago aumente entre 40% a 60%, em alguns casos até mais que isso.
Multa contratual acima de 2%
Outra cobrança que pode elevar o valor devido é a multa, em caso de atraso no pagamento, superior a 2%.
Há casos em que essa cobrança chega a 20%, algo que não é permitido. Esse tipo de cobrança, mesmo que feita nos contratos depois de 2009, não é válida.
Comissão de permanência cobrada de forma cumulada com juros e multa
A comissão de permanência é um valor cobrado pelas instituições financeiras quando o consumidor não realiza o pagamento nas datas corretas.
Ocorre que, em diversos casos, essa cobrança é feita de forma cumulada com os juros remuneratórios, moratórios e multa contratual. E isso não é permitido pela justiça, de acordo com o julgamento do Recurso Especial de nº 1.058.114/RS, pelo STJ.
Esse tipo de cobrança cumulada, mesmo que feita nos contratos depois de 2009, não é válida.
Qual o prazo para fazer esse pedido de revisão do contrato judicialmente?
Atualmente, a justiça tem entendido que o prazo para a revisão de contratos é de 10 (dez) anos.
E esse prazo tem o seu início na data em que for feito o último pagamento do contrato.
Quem fez o financiamento, por exemplo, com esses tipos de cobranças indevidas e pagou a última parcela em 26.05.2010, ainda poderia entrar com a ação, porque o último dia dos 10 anos acabaria hoje.
Acontece, porém, que muitos contratos que têm essas abusividades sequer chegaram ao fim, por causa de seu longo prazo de duração, possibilitando a sua revisão.
O que fazer?
É fundamental que o seu contrato de financiamento e planilha evolutiva (onde todos os pagamentos são incluídos e, também, o saldo devedor atualizado) sejam analisados.
Esses documentos dirão se você tem direito ou não a pedir esse tipo de revisão.
Além disso, é importante que seja feita uma perícia, através de um contador/economista para saber qual será o valor que pode ser diminuído da sua parcela e saldo devedor ou, ainda, caso você tenha pago além do que deve, quanto poderá ser devolvido a você.
– Dr. Rafael Rocha Filho