Há Problema em Completar a Assinatura das Testemunhas em um Documento?

Hombre De Raza Negra Firma Papeles

Essa situação, de ausência de assinatura das testemunhas, ocorre com bastante frequência em contratos, que são instrumentos particulares de manifestação de vontades, onde as partes contratantes assinam, mas deixam em branco o campo da assinatura das testemunhas.

 

         Quando alguma disposição do contrato não é cumprida, a outra parte, pretendendo ingressar com ação judicial, pede para que alguém assine como testemunha.

 

         Será que isso é proibido?

 

         Não. Não há problema em alguém assinar como testemunha naqueles documentos que ficaram com as linhas em branco, quando foram firmados pelas partes.

 

         A assinatura posterior, pelas testemunhas, em documento particular, por não estarem presentes no ato de sua formação, não invalida o documento, ante a possibilidade das assinaturas serem opostas em momento posterior ao ato da criação do título executivo extrajudicial, sendo as testemunhas meramente instrumentárias (STJ – REsp 1.127/SP, REsp 8.849/DF e REsp 541.267).

 

         Aliás, esse é o posicionamento da Justiça, veja:

 

APELAÇÃO. EXECUÇÃO E EMBARGOS. CONTRATO. ASSINATURA DE TESTEMUNHAS. IRREGULARIDADE AFASTADA. INEXIGIBILIDADE DO TÍTULO EXECUTIVO RECONHECIDA POR FUNDAMENTO DIVERSO DA SENTENÇA. PROCEDÊNCIA DOS EMBARGOS E EXTINÇÃO DA EXECUÇÃO MANTIDOS. APELO DESPROVIDO.

I – Segundo entendimento uníssono do Superior Tribunal de Justiça, o fato das testemunhas do documento particular não estarem presentes ao ato de sua formação não retira sua executoriedade, ante a possibilidade das assinaturas serem apostas em momento posterior ao ato da criação do título executivo extrajudicial, sendo as testemunhas meramente instrumentárias.

II – Conquanto prever o artigo 784, III, Código de Processo Civil, que o contrato particular subscrito por duas testemunhas é título executivo, somente torna-se hábil a instruir o processo de execução quando representa obrigação, líquida, certa e exigível – artigo 783 da lei de ritos.

III – Inexigível o contrato em que a devedora dirige o pagamento pactuado a terceiro que sequer assinou o ajuste firmado com o credor.

IV – Apelo desprovido. Majoração dos honorários recursais em favor dos apelados.

(TJGO, APELACAO 0264008-68.2011.8.09.0170, Rel. BEATRIZ FIGUEIREDO FRANCO, 4ª Câmara Cível, julgado em 18/03/2019, DJe  de 18/03/2019).

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE EXECUÇÃO. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. CONTRATO DE COMPRA E VENDA COM ASSINATURA DE DUAS TESTEMUNHAS. TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL. ASSINATURAS NÃO CONTEMPORÂNEAS. TESTEMUNHAS INSTRUMENTÁRIAS. DECISÃO MANTIDA.

A exceção de pré-executividade se presta ao exame de matérias que se relacionem com os pressupostos processuais, condições da ação ou nulidades e defeitos formais flagrantes do título executivo, uma vez que nesta via de defesa não se abre oportunidade para ampla produção de provas.

O fato de as testemunhas assinarem a avença posteriormente, e não na presença das partes, não retira a executividade do título, por se tratar de testemunhas instrumentárias e não oculares do negócio jurídico. Precedentes do STJ. AGRAVO DE INSTRUMENTO CONHECIDO E IMPROVIDO.

(TJGO, Agravo de Instrumento ( CPC ) 5396023-91.2018.8.09.0000, Rel. MAURICIO PORFIRIO ROSA, 1ª Câmara Cível, julgado em 31/01/2019, DJe  de 31/01/2019).

 

         Mas você sabe por que vários contratos têm espaço para duas testemunhas assinarem?

 

Entenda o motivo da assinatura de duas testemunhas em documento particular

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         Quando alguém entra com uma ação contra outra pessoa, geralmente, esse processo será de conhecimento e seguirá um caminho lógico e previsto na lei que pode levar um bom tempo, veja, em resumo, como é a tramitação de um processo judicial:

 

Petição inicial > citação > audiência de conciliação > defesa > despacho saneador > audiência de instrução > memoriais > sentença > recursos > cumprimento de sentença/execução > defesa ou pagamento > satisfação da obrigação > extinção do processo.

 

         Esse é um breve resumo do que ocorre em boa parte dos processos cíveis, no Brasil. Tudo isso, não raro, leva de 3 ou 4 anos para se efetivar.

 

         Ocorre que, quando há um documento particular, com a assinatura por duas testemunhas, prevendo as obrigações de cada parte e haja o descumprimento de alguma obrigação, o prejudicado poderá entrar com uma ação de execução.

 

         A assinatura das duas testemunhas, portanto, confere exigibilidade ao documento.

 

         Nesta ação, todo o caminho anteriormente mencionado será reduzido. O processo já começará seguinte fase:

 

Cumprimento de sentença/execução > defesa ou pagamento > satisfação da obrigação > extinção do processo.

 

         No geral, isso pode levar de 1 a 2 anos para finalizar.

 

         Além da questão do tempo, o custo de uma execução é menor do que de um processo de conhecimento; as defesas têm matéria mais restrita; há menos recursos; aumentam as chances de bloquear algum patrimônio do devedor rapidamente para garantir o pagamento, etc.

 

         É significativamente mais vantajoso propor uma execução do que uma ação de conhecimento.

 

         O documento particular, entretanto, que não contiver a assinatura de duas testemunhas, não pode ser utilizado para propor uma ação de execução, como faculta o art. 784, inciso III, do Código de Processo Civil (CPC), terá de ser um processo de conhecimento.

 

         Ele até pode ser utilizado para propor uma ação monitória, que também tem chance de abreviar o curso do processo, todavia, basta a apresentação da defesa (embargos monitórios) do requerido para que o processo seja convertido em uma ação de conhecimento.

 

         É melhor, então, para quem tenha um documento particular sem a assinatura das testemunhas quando da sua realização, pedir para que duas pessoas assinem o documento, possibilitando que seja proposta uma ação de execução.

 

         Existem documentos particulares que não precisam de assinatura de duas testemunhas para servirem como títulos executivos extrajudiciais. Vou explicar alguns exemplos.

 

Contrato de aluguel e taxas de condomínio

 

         O contrato de aluguel e as taxas de condomínio são hipóteses de documentos que não necessitam da assinatura de duas testemunhas.

 

         É que o art. 784, inciso VIII, do CPC, assim diz:

 

Art. 784. São títulos executivos extrajudiciais:

(…)

VIII – o crédito, documentalmente comprovado, decorrente de aluguel de imóvel, bem como de encargos acessórios, tais como taxas e despesas de condomínio;

 

         O entendimento do Poder Judiciário sobre esse tema é, de igual modo, idêntico à previsão da lei:

 

APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. CRÉDITO DECORRENTE DE SUBLOCAÇÃO CONSENTIDA. PRESCINDIBILIDADE DA ASSINATURA DE DUAS TESTEMUNHAS. EXECUTIVIDADE À LUZ DO INCISO VIII DO ART. 784 DO CPC.

I – Ao teor do art. 14 da Lei nº 8.245/91, aplicam-se às sublocações, no que couber, as disposições relativas às locações. Nos termos do inciso VIII do art. 784 do CPC, o crédito decorrente de aluguel (leia-se, no caso, sublocação), comprovado por contrato escrito, é título executivo, que prescinde da assinatura de testemunhas;

II – Pela dicção do inciso II do art. 373 do CPC, é da parte requerida os ônus da prova dos fatos desconstitutivos, modificativos e extintivos do direito do requerente;

III – A tese de insubsistência da sublocação legítima e consentida reclama prova inconteste da cessão da locação primitiva, com a entrega das chaves pelo locatário originário, sem o quê poder-se-ia presumir prorrogada a locação por prazo indeterminado, segundo exegese do parágrafo único do art. 56 da Lei n. 8.245/91 (Lei do Inquilinato);

IV – Demonstrada a existência do negócio jurídico da sublocação, e sendo esta consentida, cumpria a parte devedora, sublocatária, comprovar o pagamento dos aluguéis e acessórios, sob pena de responder por sua desídia, fato que, no caso em concreto, materializa o adágio popular de que ?Quem Paga mal Paga Duas Vezes?, porquanto confessado pela apelante ter efetuado o pagamento a terceira pessoa, diversa do contrato assumido, sem legitimação para receber e dar quitação ao pacto da sublocação, ficando sujeito a cobrança da obrigação de que não se desonerou com quem de direito;

V – Sentença mantida, com aplicação da majoração prevista no § 11 do art. 85 do CPC. APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E DESPROVIDA.

(TJGO, APELACAO 0207186-46.2014.8.09.0011, Rel. CARLOS ROBERTO FAVARO, 3ª Câmara Cível, julgado em 26/10/2018, DJe  de 26/10/2018).

 

         E, de modo semelhante, temos o caso dos contratos de honorários advocatícios.

 

Contrato de honorários advocatícios

 

         No caso dos contratos de honorários advocatícios, a previsão legal que garante o documento com um título executivo, é a do art. 24, caput, da Lei de nº 8.906/94, que assim fala:

 

Art. 24. A decisão judicial que fixar ou arbitrar honorários e o contrato escrito que os estipular são títulos executivos e constituem crédito privilegiado na falência, concordata, concurso de credores, insolvência civil e liquidação extrajudicial.

 

         A Justiça também entende dessa maneira:

 

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE EXECUÇÃO. EMBARGOS DO DEVEDOR. CONTRATO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ASSINATURA DE DUAS TESTEMUNHAS. DISPENSA. INEXISTÊNCIA DE CONDIÇÕES A SEREM IMPLEMENTADAS.

1- Conforme entendimento sedimentado no egrégio STJ, o contrato de honorários advocatícios regularmente assinado pelas partes, é título executivo (art. 24 da Lei 8.906/94), independentemente da assinatura de duas testemunhas (AgRg no AREsp 372.069/RJ, REsp 1070661/SP, REsp 400.687/AC).

2- Tendo a advogada apelada laborado em favor do apelante em feitos já arquivados no juízo de origem e não demonstrando este eventual condição a ser implementada por aquela, deve o embargante/apelante cumprir a cláusula contratual que impõe o pagamento de honorários mesmo havendo acordo nas demandas. APELO DESPROVIDO.

(TJGO, Apelação (CPC) 5192423-23.2018.8.09.0137, Rel. CARLOS HIPOLITO ESCHER, 4ª Câmara Cível, julgado em 19/12/2019, DJe  de 19/12/2019).

 

         Não há necessidade, portanto, que haja a assinatura de duas testemunhas nos contratos de honorários advocatícios. Havendo a assinatura dessas testemunhas, isso não trará nenhum problema jurídico, apenas é desnecessário.

 

         Em outros contratos, entretanto, isso poderá resultar em um imenso problema para o credor e uma boa oportunidade de defesa para o executado/devedor.

 

Quais as consequências de quem entra com uma execução com contrato sem assinatura de duas testemunhas?

 

         Como eu disse anteriormente, a assinatura de duas testemunhas em um documento particular garante a exigibilidade, requisito indispensável para tornar um documento em título executivo e possibilitar o início da ação de execução.

 

         Caso alguém entre com uma ação de execução e o seu documento particular não contenha a assinatura de duas testemunhas, sendo hipótese de assinatura obrigatória, a execução não poderá prosseguir.

 

         A parte contrária poderá, mesmo sendo devedora daquele valor cobrado, alegar apenas essa nulidade processual que o Judiciário, muito provavelmente, irá acolhê-la, declarando como nula a execução e a extinguindo, como aconteceu nesse caso:

 

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE EXECUÇÃO. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. AUSÊNCIA DA ASSINATURA DE DUAS TESTEMUNHAS. NÃO EXECUTORIEDADE DOS TÍTULOS QUE INSTRUEM A EXECUÇÃO.

O documento particular assinados pelo devedor e por duas testemunhas é título executivo extrajudicial, conf. art. 784, III, do CPC. No caso, ausentes as assinaturas das testemunhas nos contratos, resta afastada a executoriedade dos títulos.Não pode prosperar ação de execução que se serve de documentos sem força executiva, impondo-se a extinção do feito por ausência de pressuposto de constituição e de desenvolvimento regular do processo (art. 485, IV, do CPC). AGRAVO DE INSTRUMENTO CONHECIDO E PROVIDO.

(TJGO, Agravo de Instrumento ( CPC ) 5315780-34.2016.8.09.0000, Rel. OLAVO JUNQUEIRA DE ANDRADE, 5ª Câmara Cível, julgado em 06/06/2017, DJe  de 06/06/2017)

 

         Com isso, quem entrou com a ação não receberá o seu crédito, terá de arcar com todas as despesas do processo, como custas judiciais iniciais e honorários de sucumbência, que são fixados entre 10% e 20% do valor da ação.

 

         Isso não impede que o credor entre com uma nova ação, posteriormente. Todavia, o prejuízo financeiro será tamanho que, talvez, nem tenha mais interesse nisso.

 

         Imagine que a execução seja no valor de 1 milhão de reais. Por esse simples deslize, o credor poderá ter de pagar ao devedor entre 100 mil e 200 mil reais, a título de honorários de sucumbência.

 

         Diante disso, é muito importante verificar todos os documentos antes de ingressar com uma ação e contar com uma assessoria jurídica qualificada e especializada na área.

 

         Vários são os motivos pelos quais um processo pode ser invalidado, dependendo, em diversos caso, da capacidade técnica das partes alegar e conseguir o melhor proveito para o seu interesse.

 

– Dr. Rafael Rocha Filho

 

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