Decisão obriga União a fornecer remédio a portador de distrofia muscular

Para magistrado, é dever dos entes públicos custear o tratamento aos necessitados. Medicamento é aprovado pela União Europeia e utilizado em 23 países

O desembargador federal Johonsom di Salvo, da Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3), manteve a sentença da 6ª Vara Federal de São Paulo que concedeu a tutela antecipada (liminar) para que a União Federal forneça a uma criança portadora de Distrofia Muscular de Duchenne o medicamento Translarna (Ataluren), garantindo o fornecimento contínuo ao tratamento da doença nas quantidades descritas no relatório médico.

Para o magistrado, como integrante do Sistema Único de Saúde (SUS), a União, o Estado e município de São Paulo têm o dever de disponibilizar os recursos necessários para o fornecimento do medicamento para a parte autora. Para ele, está suficientemente configurada a necessidade da criança – portadora de moléstia grave, que não possui disponibilidade financeira para custear o seu tratamento – de ver atendida o seu pedido, uma vez que é legítima e constitucionalmente garantida.

“O direito à saúde é um direito básico do cidadão, e o Poder Público não pode, a nenhum pretexto, deixar de cumprir com sua obrigação que é justamente fornecer ações adequadas nessa área. O acesso à saúde compreende além da disponibilização por parte dos entes públicos de hospitais, médicos, enfermeiros etc., também procedimentos clínicos, ambulatoriais e medicação conveniente”, afirmou.

Para o desembargador, ao contrário do sustentava a União no recurso ao TRF3, há prova suficiente, conforme laudo médico, que descreve com detalhes a situação da paciente e concluiu pela oportunidade e conveniência do fornecimento do medicamento então solicitado.

Conforme o laudo, trata-se de uma criança de 8 anos de idade, portadora de Distrofia Muscular De Duchenne, doença genética rara e atualmente incurável, que “se destaca por ser a doença fatal mais frequente da infância […] caracterizada por fraqueza muscular progressiva que inicia a partir dos 3 anos de idade, evoluindo com perda da marcha entre 8 e 12 anos, seguido de acentuada atrofia musculoesquelética e grave deformidade da coluna vertebral, culminando com a morte em torno de 20 anos de idade, decorrente de insuficiência cardiorrespiratória”.

Na prescrição, a médica neurologista da criança, justificou a ministração do medicamento Ataluren como tratamento que “determinará uma real intervenção na evolução da doença, modificando o curso clínico progressivo e a intensidade da fraqueza muscular, com aumento na sobrevida e na qualidade de vida”. Ressaltou ainda que o medicamento já foi liberado na União Europeia com o nome comercial Translarna.

“Cabe ao Poder Público, obrigatoriamente, zelar pela saúde de todos, disponibilizando, àqueles que precisarem de prestações atinentes à saúde pública, os meios necessários à sua obtenção. O quadro de saúde da parte agravada é sério e a excepcionalidade mais que recomenda a providência imposta ao ente público”, destacou o magistrado.

Eficácia

A União alegava também o remédio não havia completado todo o ciclo de pesquisa no Brasil e, portanto, não fazia parte de nenhum programa de medicamentos de Assistência Farmacêutica estruturado pelo Ministério da Saúde. Destacava, inclusive, que não havia comprovação da eficácia do medicamento e também, por esta razão, não poderia o Judiciário obrigar a Administração a fornecer medicamento sem registro na Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa).

Para o desembargador, o fato do medicamento não estar aprovado pela Anvisa não proíbe o seu uso no tratamento da criança. Ele salienta que o remédio é utilizado e provado condicionalmente pela Agência Europeia de Medicamentos (EMA), desde agosto de 2014, para o tratamento de pacientes com Duchenne em 23 países. Além disso, começaria a ser fornecido gratuitamente pelo Governo da Grã Bretanha.

Acrescenta que ao, decidir sobre tratamentos de saúde e fornecimento de remédios, o Poder Judiciário não está se investindo da função de cogestor do Poder Executivo, ao contrário do que afirma a União. Na verdade, o Judiciário estaria dando efetividade ao artigo 6º, inciso I, letra “d”, da Lei 8.080/90 que insere no âmbito da competência do SUS a assistência terapêutica integral, inclusive farmacêutica.

“A compra de medicamentos toma-se por base a Relação Nacional de Medicamentos Essenciais (Rename), uma relação de remédios básicos criada pelo Ministério da Saúde que é dificilmente atualizada”, justificou.

Por fim, o desembargador Johonsom di Salvo, afirmou que o Judiciário não está proibido de conceder antecipações de tutela em desfavor do Poder Público, pois isso importaria em negativa de jurisdição a violar o artigo 5°, inciso XXXV da Constituição Federal.

Fonte: TRF3

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