ANTIGO PROPRIETÁRIO PODE SER INDENIZADO POR LEILÃO COM NULIDADES

Sem Título 1

A realização de um leilão extrajudicial de imóvel, em decorrência da falta de pagamento das parcelas combinadas, é a medida mais rápida e eficaz do credor para buscar o seu crédito.

 

Esse tipo de leilão não depende da intervenção do judiciário e corre, em boa parte do procedimento, diretamente perante o Cartório onde o imóvel está matriculado.

 

Geralmente, esse procedimento de leilão se inicia e termina em 6 (seis) meses, com um custo muito inferior a qualquer demanda que o credor pudesse intentar contra o devedor para o recebimento do crédito.

 

Por isso, a maioria dos contratos de compra e venda de imóveis, com financiamento direto com a empresa do ramo imobiliário ou com um banco, possui o pacto de alienação fiduciária, que deve ser registrado para que o credor possa utilizar dessa prerrogativa.

 

Ocorre, todavia, que o procedimento do leilão pode estar contaminado por nulidades, que acarretam na invalidação desse procedimento.

 

Acerca de algumas dessas nulidades, que não são objeto desse texto, tratei nesses outros artigos que você pode clicar e acessar:

 

 

O importante que você deve saber é que, existindo nulidade no leilão, reconhecida judicialmente, isso pode acarretar na invalidação do procedimento, retornando o imóvel ao antigo proprietário ou, caso isso não seja possível, na restituição dos valores pagos.

 

Restituição do imóvel ao antigo proprietário

 

Havendo o reconhecimento da nulidade do procedimento do leilão, é possível que as partes voltem ao estado anterior, fazendo com que o imóvel não siga adiante no procedimento do leilão e que o antigo proprietário retome os pagamentos.

 

Essa é a previsão legal para o reconhecimento de qualquer tipo de nulidade em negócios jurídicos, como determina o art. 182 do Código Civil, veja:

 

Art. 182. Anulado o negócio jurídico, restituir-se-ão as partes ao estado em que antes dele se achavam, e, não sendo possível restituí-las, serão indenizadas com o equivalente.

 

Por vezes, no entanto, quando ocorre o reconhecimento da nulidade desse leilão, o imóvel já foi arrematado e um terceiro, que é considerado de boa-fé, passa a ser o dono do imóvel, impedindo que o antigo proprietário o retome.

 

O reconhecimento da boa-fé desse terceiro se dá, principalmente, quando ele não contribuiu em nada para a ocorrência da nulidade.

 

Nessa situação, o antigo proprietário não terá o imóvel de volta, aplicando-se a segunda parte do art. 182, havendo a indenização.

 

Impossibilidade de restituição do imóvel e convolação em perdas e danos – indenização

 

Não sendo possível a restituição do imóvel ao antigo proprietário, haverá a convolação de todo esse prejuízo em perdas e danos, isto é, em indenização, que será arcada pelo credor que realizou o leilão que, via de regra, é um banco ou empresa do ramo imobiliário.

 

A jurisprudência (decisões reiteradas da Justiça) não definiu, de forma pacífica, como essa indenização será calculada.

 

Há casos em que foi decidido que o valor da indenização será o valor de todas as parcelas pagas, devidamente atualizadas e acrescidas de juros moratórios de 1% ao mês, desde a citação, veja:

 

APELAÇÃO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE ATOS JURÍDICOS. CONTRATO COM CLÁUSULA DE ALIENAÇÃO DE IMÓVEL EM GARANTIA FIDUCIÁRIA. FASE DE LIQUIDAÇÃO DA SENTENÇA. EXTINÇÃO DA LIQUIDAÇÃO AO FUNDAMENTO DE INEXISTÊNCIA DE VALORES A RECEBER PELA LIQUIDANTE. ENTENDIMENTO EQUIVOCADO. DECISÕES ANTERIORES RECONHECENDO A EXISTÊNCIA DESTE DIREITO. SENTENÇA REFORMADA.

 

APELAÇÃO PROVIDA NESSA PARTE. Mostra-se equivocada a extinção da fase de liquidação da sentença por inexistência de valores a receber pela liquidante se, em decisões anteriores, há o reconhecimento deste direito. APELAÇÃO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE ATOS JURÍDICOS. CONTRATO COM CLÁUSULA DE ALIENAÇÃO DE IMÓVEL EM GARANTIA FIDUCIÁRIA. FASE DE LIQUIDAÇÃO DA SENTENÇA. VENDA IRREGULAR DO IMÓVEL CEDIDO EM GARANTIA FIDUCIÁRIA. CONVERSÃO EM PERDAS E DANOS. VALOR QUE DEVE CORRESPONDER ÀS PRESTAÇÕES PAGAS DURANTE A EXECUÇÃO DO CONTRATO, NÃO AO VALOR DO IMÓVEL. APELAÇÃO DESPROVIDA NESSA PARTE. No caso, houve a alienação irregular de imóvel cedido em garantia fiduciária, antes da quitação integral do contrato em que constituída a garantia.

 

Assim, as perdas e danos, nesses casos, deve corresponder ao valor das prestações pagas durante a execução do contrato, e não o valor do imóvel.” (TJSP, 31ª Câmara de Direito Privado, AC n. 3736.40.2021.8.26.0309, Rel. Des. Adilson de Araújo, DJe de 16-3-2022).

 

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE CONHECIMENTO. MÚTUO COM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE BEM IMÓVEL. INTENTO ANULATÓRIO. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE FIDUCIÁRIA. HIGIDEZ. LEILÃO

 

EXTRAJUDICIAL. FALTA DE INTIMAÇÃO/NOTIFICAÇÃO DOS DEVEDORES FIDUCIANTES. NULIDADE RECONHECIDA. CONVERSÃO EM PERDAS E DANOS. CASUÍSTICA. SENTENÇA REFORMADA.

 

1. Considerando a natureza jurídica da alienação fiduciária em garantia, seu exercício mantém-se viável enquanto possível o exercício do próprio direito de crédito por ela garantido, ou seja, para fins prescricionais, aplica-se ao caso a disciplina constante no Código Civil, de sorte a ser possível ao credor fiduciário promover a consolidação da propriedade fiduciária se observar o quinquênio contado do vencimento da última prestação contratual. Inteligência do disposto no art. 206, § 5º, I, do CC. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça.

 

2. Mesmo para os contratos anteriores à vigência da Lei n. 13.465/2017 (que alterou preceitos da Lei n. 9.514/1997), é necessária a notificação do devedor fiduciante acerca dos detalhes da realização do leilão extrajudicial, seja ela pessoal (regra geral) ou mesmo por edital (exceção, quando em local incerto e não sabido o notificado, como na espécie), providência não adotada neste feito, acarretando a nulidade correspondente. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça.

 

3. Anulado o leilão extrajudicial do imóvel, tendo em vista envolver, como adquirente, terceiro de boa-fé, é cabível a convolação do direito dos autores/apelantes em perdas e danos, cujo valor deve ser definido segundo a apuração das prestações pagas por eles no curso do contrato, devidamente atualizadas (IPCA – desde cada pagamento) e acrescidas de juros moratórios (1% a.m. – desde a citação). Casuística. Precedentes. Apelação cível parcialmente provida.

 

Em outras oportunidades, os Tribunais decidem que o cálculo da indenização deverá se dar por meio do cálculo do valor de mercado do imóvel abatido do valor do saldo devedor da dívida, observe:

 

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA DE DESCONSTITUIÇÃO DA CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE E CANCELAMENTO DA ALIENAÇÃO.

 

1. NECESSIDADE DE INTIMAÇÃO PESSOAL DO DEVEDOR FIDUCIANTE ACERCA DA REALIZAÇÃO DO LEILÃO EXTRAJUDICIAL, AINDA QUE ANTES DA ÉGIDE DA LEI N. 13.465/2017. A notificação pessoal do devedor fiduciante acerca da realização do leilão extrajudicial (data, lugar e horário) é necessária, ainda que antes da entrada em vigor da Lei nº 13.465/2017, que alterou a Lei nº 9.514/97 por força da redação anterior de seu artigo 39, inciso II, que estabelecia a aplicação das regras insertas nos artigos 29 a 41, do Decreto-Lei nº 70/66. Precedentes do colendo STJ e desta egrégia Corte.

 

2. COMUNICAÇÃO SOBRE A REALIZAÇÃO DO LEILÃO EXTRAJUDICIAL. PRAZO EXÍGUO. IRREGULARIDADE VERIFICADA. In casu, os devedores fiduciários foram notificados da realização do leilão extrajudicial em prazo exíguo (menos de 24 horas), o que torna-se desproporcional e injusta a hasta pública realizada, visto dificultar ou inviabilizar qualquer medida, planejamento e participação dos Autores/Apelantes, restringindo o direito de preferência na arrematação do bem.

 

3. LEI N.º 9.514/97. INTERPRETAÇÃO EM CONSONÂNCIA AO CPC. As disposições contidas na Lei n.º 9.514/97 não devem ser interpretadas de maneira insolada, mostrando-se necessário interpretá-las em consonância com o ordenamento jurídico pátrio, notadamente o Código de Processo Civil, sob pena de se admitir situações anômalas, como a arrematação de imóvel em leilão extrajudicial por preço vil.

 

4. ARREMATAÇÃO DE IMÓVEL POR PREÇO VIL. RECONHECIDA. A tese de arrematação por preço vil está amparada no fato de que o imóvel foi arrematado por quantum inferior a 50% (cinquenta por cento) do seu real valor de mercado. In casu, o imóvel foi arrematado pelo percentual de 11% do valor da avaliação realizada pelo credor, o que caracteriza preço vil.

 

5. RESTITUIÇÃO DA DIFERENÇA ENTRE O VALOR DA AVALIAÇÃO DO BEM AO TEMPO DO ARREMATE E O SALDO DEVEDOR NAQUELE DIA, ATUALIZADO PELO INPC E ACRESCIDA DE JUROS MORATÓRIOS DE 1% A.M. DESDE A DATA DO ARREMATE. A alienação do imóvel, por meio de leilão, sem observância às regras de regência, resulta na nulidade do procedimento e revela o ato ilícito cometido pela construtora, ora 2ª Apelada, a qual deve arcar com os prejuízos impostos aos Autores/Apelados, de forma que para se apurar eventual saldo credor em favor destes, há de se considerar a diferença entre o valor da avaliação do bem ao tempo do arremate e o saldo devedor, atualizado pelo INPC e acrescida de juros moratórios de 1% (um por cento) ao mês desde a data do arremate, porquanto já consolidada a propriedade arrematada por terceiro de boa-fé.

 

6. ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL DO BEM. MODERAÇÃO. PRESERVAÇÃO DOS DIREITOS DE COMPRADORES DE BOA-FÉ. Consolidada a propriedade arrematada por terceiro de boa-fé, inclusive escriturando o imóvel em seu nome, faz com que adimplemento substancial do imóvel torna-se inócuo, face à preservação dos direitos de compradores de boa-fé.

 

7. PREQUESTIONAMENTO FICTO. POSSIBILIDADE. Não é atribuída ao Judiciário a função de órgão consultivo, mormente, quando a questão recursal posta em análise foi integralmente resolvida, não cabendo a esta Corte se manifestar sobre cada dispositivo mencionado pelas partes.

 

8. VERBA SUCUMBENCIAL. ALTERAÇÃO. Face ao parcial êxito com o recurso em tela, impõe-se a modificação da verba sucumbencial fixada pelo Magistrado a quo, reconhecendo-se a sucumbência da parte Ré, ora 2ª Apelada.

 

9. HONORÁRIOS RECURSAIS. Descabível a majoração dos honorários advocatícios (art. 85, § 11, do CPC), diante do provimento, parcial, do recurso, conforme orientação do colendo STJ. APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E PARCIALMENTE PROVIDA. SENTENÇA REFORMADA.

 

(TJGO, PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Recursos -> Apelação Cível 0164432-66.2014.8.09.0051, Rel. Des(a). ÁTILA NAVES AMARAL, 3ª Câmara Cível, julgado em 19/05/2022, DJe  de 19/05/2022).

 

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ANULATÓRIA. LEI Nº 9.514/1997. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE COISA IMÓVEL. LEILÃO EXTRAJUDICIAL. NECESSIDADE DE NOTIFICAÇÃO PESSOAL DO DEVEDOR FIDUCIANTE ACERCA DA DATA DA REALIZAÇÃO DO LEILÃO, AINDA QUE ANTES DA ÉGIDE DA LEI N. 13.465/2017. PRECEDENTES STJ. RESTITUIÇÃO DA DIFERENÇA ENTRE O VALOR DA AVALIAÇÃO DO BEM AO TEMPO DO ARREMATE E O SALDO DEVEDOR NAQUELE DIA, ATUALIZADO PELO INPC E ACRESCIDA DE JUROS MORATÓRIOS DE 1% A.M. DESDE A DATA DO ARREMATE.

 

1 – A notificação pessoal do devedor fiduciante acerca da realização do leilão é necessária, ainda que antes da entrada em vigor da Lei nº 13.465/2017, que alterou a Lei nº 9.514/97 para constar, expressamente, a obrigatoriedade, pois já entendia-se que o artigo 39 da referida Lei assegurava que serão aplicadas as disposições dos arts. 29 a 41 do Decreto-lei nº 70/1966, que preveem o procedimento de leilão extrajudicial de imóvel submetido à execução hipotecária de que trata o Decreto, e com base nos quais foi consolidada a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça acerca da necessidade de intimação pessoal do devedor acerca da data da realização do leilão extrajudicial.

 

2 – A alienação do imóvel, por meio de leilão, sem observância às regras de regência, resulta na nulidade do procedimento e revela o ato ilícito cometido pela instituição financeira, a qual deve arcar com os prejuízos impostos à autora/apelada, de forma que para se apurar eventual saldo credor em favor desta, há de se considerar a diferença entre o valor da avaliação do bem ao tempo do arremate e o saldo devedor, atualizado pelo INPC e acrescida de juros moratórios de 1% (um por cento) ao mês desde a data do arremate, porquanto já consolidada a propriedade arrematada pelo terceiro de boa-fé.

 

APELO CONHECIDO E DESPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA.

 

(TJGO, PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Recursos -> Apelação Cível 5285976-91.2018.8.09.0051, Rel. Des(a). DESEMBARGADOR ITAMAR DE LIMA, 3ª Câmara Cível, julgado em 10/03/2022, DJe  de 10/03/2022)

 

Independentemente da forma como ocorrerá a restituição dos valores, é certo que, havendo irregularidades no leilão do imóvel, o antigo proprietário poderá pedir o reconhecimento de sua nulidade, podendo reaver o imóvel ou, então, caso isso não seja mais possível, pleitear indenização por perdas e danos.

 

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Dr. Rafael Rocha Filho

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