Covid-19 – Doenças Contagiosas e o Direito Penal
Em um momento como esse, 23 de março de 2020, onde o mundo enfrenta uma pandemia gerada pelo vírus chinês Covid-19, o tal Corona vírus, muitas questões começam a serem levantadas haja vista tantos problemas causados nos pilares sociais, como economia, saúde, direitos como a liberdade individual sendo colocadas em segundo plano.
E a questão que deve se analisar dentre tantas, é o que o Direito Penal Brasileiro fala sobre doenças contagiosas, e sua contenção.
Um bem jurídico tão importante a ser tutelado como a integridade física, a incolumidade da saúde, por certo que recebeu tratamento especial do código penal.
Nesse sentido será demonstrado o que o Direito Penal Brasileiro fala sobre doenças contagiosas, conhecido tema da periclitação da vida e da saúde, que é o gênero dos crimes de perigo.
Vamos atentar a cada um dos tipos penais.
1 – Perigo de contágio venéreo.
Art. 130 – Expor alguém, por meio de relações sexuais ou qualquer ato libidinoso, a contágio de moléstia venérea, de que sabe ou deve saber que está contaminado:
Pena – detenção, de três meses a um ano, ou multa.
- 1º – Se é intenção do agente transmitir a moléstia:
Pena – reclusão, de um a quatro anos, e multa.
- 2º – Somente se procede mediante representação.
Uma das primeiras preocupações do legislador foi com a transmissão de doenças venéreas, posto que é um dos meios mais corriqueiros de transmissão de doenças, como HIV, Sífilis, entre outras. E a humanidade sempre padeceu com isso.
2 – Perigo para a vida ou saúde de outrem
Art. 132 – Expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto e iminente:
Pena – detenção, de três meses a um ano, se o fato não constitui crime mais grave.
Parágrafo único. A pena é aumentada de um sexto a um terço se a exposição da vida ou da saúde de outrem a perigo decorre do transporte de pessoas para a prestação de serviços em estabelecimentos de qualquer natureza, em desacordo com as normas legais. (Incluído pela Lei nº 9.777, de 1998)
Esse tipo penal merece destaque para essa temática. Pois o contaminado, sabendo que está nesse estado, age de forma negligente levando contaminação a outros, pode ser enquadrado nessa previsão.
Veja, o legislador buscou tratar de muitas formas sobre os crimes de perigo, sabendo que podem surgir a qualquer momento.
As pessoas que vivem em comunidades devem ter responsabilidade por aqueles que estão próximos. O problema do contágio não é só seu, é de todos.
3 – Lesão Corporal.
art. 129. Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem:
Pena – detenção, de três meses a um ano.
O tipo penal da Lesão corporal pode ser tanto a ofensa a integridade física bem como a saúde, até a saúde emocional, como é o caso de muitos homens que estão sendo condenados por abuso psicológico de suas companheiras que mesmo sem laudo do IML, recebem sentenças condenatórias.
No caso do contágio, é claro que a saúde como um todo é atingida, “ofender … a saúde de outrem”.
Sim, amigos, ofender a saúde de alguém por contágio pode ser enquadrado como lesão corporal, mas, será necessário comprovar o nexo de causalidade para que se pense em condenação.
4 – Perigo de contágio de moléstia grave
Art. 131 – Praticar, com o fim de transmitir a outrem moléstia grave de que está contaminado, ato capaz de produzir o contágio:
Pena – reclusão, de um a quatro anos, e multa.
Aqui se enquadra perfeitamente o caso de alguém que sabendo estar contaminado age de forma obstinada a transmitir a doença a outros. Exemplo, uma pessoa que sabe estar com o Covid-19 sai pelas ruas sem máscara, ou tocando em objetos como corrimão, cuspindo neles, com o fito exclusivo de contaminar a outros.
5 – Epidemia.
Art. 267 – Causar epidemia, mediante a propagação de germes patogênicos:
Pena – reclusão, de dez a quinze anos. (Redação dada pela Lei nº 8.072, de 25.7.1990)
- 1º – Se do fato resulta morte, a pena é aplicada em dobro.
- 2º – No caso de culpa, a pena é de detenção, de um a dois anos, ou, se resulta morte, de dois a quatro anos.
Esse tipo penal estaria mais para aqueles filmes que estamos acostumados, onde um cientista vende para estrangeiros uma capsula verde, e esses estrangeiros enviam um maluco para um estádio para soltar o vírus naquele ambiente, até que chegue um mocinho e o impeça.
Fato é que a realidade alimenta a ficção e vice versa, com tantos vírus vindo todos os anos da china para o mundo, influenzas H1N1, N2, N3, N4, N5, gripe suína, gripe aviária, Covid-19, nos leva a pensar, não haveria algum sujeito criando e alastrando essas doenças?
6 – Infração de medida sanitária preventiva.
Art. 268 – Infringir determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa:
Pena – detenção, de um mês a um ano, e multa.
Parágrafo único – A pena é aumentada de um terço, se o agente é funcionário da saúde pública ou exerce a profissão de médico, farmacêutico, dentista ou enfermeiro.
Esse tipo penal vem proteger a determinação estatal e punir a desobediência.
No momento em que esse texto é escrito, vários decretos estaduais e federais estão sendo editados para conter a curva de contaminação do Covid-19.
Nesses decretas estão proibições para fechar comércios, evitar aglomerações, fechamento de rodoviárias, voos, tolhendo de fato a liberdade do cidadão como muitos nunca viram.
Não é o objetivo do texto, mas devemos refletir como os direitos são relativos, dentre eles o direito de propriedade, a exemplo, o comerciante não pode abrir seu estabelecimento. O direito de locomover-se, o cidadão não pode ir a praia, ou andar pelas ruas, entrar ou sair de determinadas cidades.
E o tipo penal acima existe para coibir toda e qualquer desobediência a esse comando estatal, ainda que seja alarmista e abusivo. Onde já se viu um governador ter competência para fechar um aeroporto internacional? Ou prefeito determinar quem entra e quem sai da cidade? Socorro.
Conclusão.
Já finalizando as breves palavras, tem-se que o Direito Penal cuidou da questão do contágio e do perigo para a vida, ainda que as penas sejam brandas, e quase não se falou em multas.
Claro que há a possibilidade inclusive de buscar indenização pelos danos morais e materiais advindos de um contágio, mesmo no processo penal.
E você o que achou? Compartilhe nos comentários a sua opinião.
Para todo caso, consulte sempre um advogado especialista no assunto.
– Dr. Rafael Rocha – Advogado Criminalista
OAB/GO 33.675