Mitos e Verdade Sobre o Auxílio-Reclusão
1. INTRODUÇÃO
A LEI Nº 8.213, de 24 de Julho de 1991, dispõe sobre os planos de benefícios da Previdência Social e traz no seu bojo um rol taxativo de prestações expressas em benefícios e serviços, os quais são verificados conforme disposição do artigo 18 da aludida norma.
Veja o rol: aposentadoria por invalidez; aposentadoria por idade; aposentadoria por tempo de serviço; aposentadoria por tempo de contribuição; aposentadoria especial; auxílio-doença; salário-família; salário-maternidade; auxílio-acidente; pensão por morte; auxílio-reclusão; serviço social; e reabilitação profissional.
Será objeto de discussão no presente trabalho o auxílio-reclusão, isso porque, dentre todos, é este o mais polêmico, sobre o qual gira numerosas discussões sociais e inverdades, resultantes de conceitos e preconceitos defendidos e difundidos por incautos.
Lançar luz sobre o mencionado benefício é medida impositiva, com o fito de jogar por terra tais inverdades que o rodeia. O que se buscará fazer no presente trabalho.
2. DESENVOLVIMENTO
2.1 AUXÍLIO-RECLUSÃO E SUA PREVISÃO LEGAL
Importa, antes de adentrar no mérito do que se propõe, apresentar a prescrição constitucional para existência do auxílio-reclusão.
A Constituição Federal no seu artigo 201, da seção em que o constituinte preocupou-se em tratar da Previdência Social, não se esqueceu ou esquivou-se da responsabilidade de registrar o auxílio-reclusão, dando-lhe a merecida importância, igualando aos demais ali arrolados, tais como auxilio maternidade, auxílio família e outros.
Com o fito de regulamentar o aludido texto constitucional, o legislador, através da Lei 8.213, de 24 de Julho de 1991, dispõe nos seus artigos 18, II, “b” e 80, procurou tratar da matéria. Entendo por bem, transcrevê-los, respectivamente:
Art. 18. O Regime Geral de Previdência Social compreende as seguintes prestações, devidas inclusive em razão de eventos decorrentes de acidente do trabalho, expressas em benefícios e serviços:
omissis
II – quanto ao dependente:
omissis
b) auxílio-reclusão;
Art. 80. O auxílio-reclusão será devido, nas mesmas condições da pensão por morte, aos dependentes do segurado recolhido à prisão, que não receber remuneração da empresa nem estiver em gozo de auxílio-doença, de aposentadoria ou de abono de permanência em serviço.
Parágrafo único. O requerimento do auxílio-reclusão deverá ser instruído com certidão do efetivo recolhimento à prisão, sendo obrigatória, para a manutenção do benefício, a apresentação de declaração de permanência na condição de presidiário.
Considerando as disposições constitucionais e legais acima mencionadas, há de concluir que o auxílio-reclusão, está amparado pelo ordenamento jurídico brasileiro, assim não há que se falar em injustiça ou recebimentos indevidos por parte daqueles que são beneficiários da prestação.
2.2 DOS MITOS E VERDADES SOBRE O AUXÍLIO-RECLUSÃO
Tendo como objetivo maior derrubar inverdades acerca do auxílio-reclusão, imprescindível debruçar na análise acerca dos mitos que o rodeia, e que muitas vezes é tema de acaloradas discussões em botequins e conversas de amigos, das mais diversas camadas sociais.
Afinal, quem não já ouviu aqueles dizeres populares, do tipo “além de criminoso ainda ganha dinheiro pra ficar na cadeia” ou “bolsa-bandido”dentre muitos outros.
Esse é apenas um exemplo do desconhecimento popular ao abordar o tema, e por essa razão faz-se relevante trazer à baila os presentes esclarecimentos.
Mister demonstrar que existem requisitos constitucionais e legais para que o indivíduo seja contemplado com os beneplácitos do auxílio-reclusão, e que distintamente do que diz a “sabedoria” popular o mesmo não é direcionado a marginais e criminosos, mas sim a dependentes de contribuintes da previdência.
Analisemos então sob a perspectiva legal, tais requisitos.
O auxílio-reclusão é benefício previdenciário devido aos dependentes do segurado recolhido à prisão, conforme prevê a Constituição Federal:
“Art. 201 – A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a: (Alterado pela EC-000.020-1998) […]
IV – salário-família e auxílio-reclusão para os dependentes dos segurados de baixa renda;”
Nesse mesmo compasso do texto constitucional a Lei 8.213, de 24 de Julho de 1991, dispõe nos seus artigos 18, II, “b” e 80, já transcritos alhures, expressam as mesmas exigências, e não deixa dúvida que o benefício é destinado aos dependentes do contribuinte preso.
Veja que a junção dos textos legais do auxílio em comento apresenta, dentre outros, três requisitos essenciais, quais sejam: qualidade de segurado, que o segurado tenha sido recolhido à prisão e a existência de dependentes, demais requisitos não abordaremos aqui.
A definição de segurado segundo as palavras de Castro e Lazzari (2009, p. 175):
É segurado da Previdência Social, nos termos do art. 9º e seus parágrafos do Decreto n. 3.048/99, de forma compulsória, a pessoa física que exerce atividade remunerada, efetiva ou eventual, de natureza urbana ou rural, com ou sem vínculo de emprego, a título precário ou não, bem como aquele que a lei define como tal, observadas, quando for o caso, as exceções previstas no texto legal, ou exerceu alguma atividade das mencionadas acima, no período imediatamente anterior ao chamado “período de graça”. Também é segurado aquele se filia facultativa e espontaneamente à Previdência Social, contribuindo para o custeio das prestações sem estar vinculado obrigatoriamente ao Regime Geral de Previdência Social – RGPS ou a outro regime previdenciário qualquer.
A qualidade de segu¬rado é mantida com o devido recolhimento das contribuições previdenciárias, assim como no chamado período de graça, quando a obrigação do recolhimento não é obrigatória em até doze meses após o livramento, conservando todos os direitos perante a previdência social.
No que pertine ao segundo requisito para a concessão do auxílio-reclusão é a prisão do segurado. Não importando se prisão de natureza penal, civil ou administrativa, cautelar ou definitiva.
O beneficio será devido somente enquanto o preso encontrar-se recolhido à prisão sob o regime fechado ou semiaberto, sendo que, nos demais casos, poderá trabalhar fora e auferir renda.
Relevante comentar que o Decreto 3.048/99, no artigo 117, § 1º, determina que depois de concedido o benefício, para ser mantido o auxílio-reclusão, o beneficiário deverá apresentar trimestralmente atestado firmado por autoridade competente para fins de comprovação de que o segurado mantém a condição de recluso.
Por fim, o requisito da qualidade de dependente do segurado. Consideram-se dependentes: o cônjuge, a companheira, o companhei¬ro e o filho não emancipado, menor de vinte e um anos ou inválido, cuja dependência econômica é presumida; os pais; e o irmão não emancipado, menor de vinte e um anos ou inválido.
Nesse pensar, fica evidenciado que a intenção do legislador não é sustentar criminosos que se encontram reclusos, mas sim, dependentes de trabalhador segurado que por razões diversas, que ignoraremos aqui, por não ser objeto relevante da presente discussão, esteja encarcerado, sem condições de prover o sustento dos seus dependentes.
Sólida é a jurisprudência do Tribunal Federal da Primeira Região acerca dos requisitos para concessão do auxílio-reclusão, vejamos:
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-RECLUSÃO. QUALIDADE DE SEGURADO. DATA DO ENCARCERAMENTO, 1. O auxílio-reclusão encontra-se previsto no art. 80 da Lei n.º 8.213/91, que exige, para a sua concessão, o cumprimento dos seguintes requisitos: a) dependente relacionado no art. 16 da Lei n.º 8.213/91; b) qualidade de segurado do recluso; c) recolhimento à prisão; d) que o recluso não perceba benefício previdenciário ou qualquer outra renda; e) baixa renda do recluso. 2. A tese defendida pela autarquia de que o pai do autor não detinha a qualidade de segurado quando da ocorrência de sua prisão não pode ser sustentada. Conforme documentos anexados aos autos o auxílio-reclusão foi solicitado administrativamente em 08/01/2010 e o último vínculo empregatício do genitor cessou em 20/11/2009. É valido ressaltar que a prisão em flagrante ocorreu no dia 14/11/2009. Sendo assim, resta evidente a manutenção da qualidade de segurado. 3. Vários são os documentos trazidos aos autos pela parte autora que indicam a prisão em período anterior ao requerimento na esfera administrativa. Ao que parece, a autarquia considerou o atestado de fls. 15 para embasar tal defesa. Tal documento comprova apenas que o detento foi recolhido na Unidade Prisional de Formiga em 24/06/2011. Todavia, conforme os atestados de pena anexados aos autos de fls. 116 e 139 demonstram que o autor foi recolhido em 14/11/2009. O fato do local de cumprimento ter sido alterado durante a execução não pode ser relevante para a concessão do auxílio. 4. Apelação da autarquia e remessa oficial a que se nega provimento.A Câmara, à unanimidade, NEGOU PROVIMENTO AO APELO DO INSS E A REMESSA OFICIAL.
(ACORDAO 00189618120144019199, JUIZ FEDERAL MARCELO MOTTA DE OLIVEIRA, TRF1 – 1ª CÂMARA REGIONAL PREVIDENCIÁRIA DE JUIZ DE FORA, e-DJF1 DATA:16/03/2018 PAGINA:.)
No mesmo compasso a jurisprudência do Tribunal Federal da Quarta Região:
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO AUXILIO-RECLUSÃO. ÓBITO DO GENITOR. COMPROVAÇÃO DA QUALIDADE DE SEGURADO DO DE CUJUS. TERMO INICIAL. CONSECTÁRIOS. 1. As condições para a concessão do benefício previdenciário de auxílio-reclusão são idênticas às estabelecidas para a pensão por morte, regendo-se pela lei vigente à época do recolhimento do segurado à prisão. 2. Para a obtenção do benefício de pensão por morte deve a parte interessada preencher os requisitos estabelecidos na legislação previdenciária vigente à data do óbito, consoante iterativa jurisprudência dos Tribunais Superiores e desta Corte. 3. Demonstrada a qualidade de segurado do falecido ao tempo do óbito, tem a autora, na condição de filhos, o direito ao recebimento do benefício de pensão por morte. 4. Os juros de mora, a contar da citação, devem incidir à taxa de 1% ao mês, até 29-06-2009. A partir de então, incidem uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança. 5. Precedente do Supremo Tribunal Federal com efeito vinculante, que deve ser observado, inclusive, pelos órgãos do Poder Judiciário. (TRF4, AC 5063360-55.2013.4.04.7100, SEXTA TURMA, Relator ARTUR CÉSAR DE SOUZA, juntado aos autos em 12/04/2018)
Destarte, andou bem o legislador ao prevê a concessão do benefício em tela aos dependentes de segurado preso, basta imaginar, por exemplo, que um criança deficiente, cuja mãe precisar em tempo integral acompanhá-la devido aos cuidados especiais que precisa receber, tendo o seu pai, trabalhador, como único provedor da família, que por um infortúnio qualquer, com ou sem dolo, envolve-se na prática de algum delito e acaba sendo preso.
A pergunta que fica é: E agora quem sustentará essa criança e essa mãe que não pode simplesmente deixá-la aos cuidados de terceiros? Como irão se alimentar? E os seus indispensáveis medicamentos, sem os quais poderá até mesmo vir a óbito, quem os comprará?
Portanto, em que pese as muitas indagações e incompreensões dos incautos, acerca do auxílio-reclusão, tem-se que este é de indispensável relevância para os dependentes de segurados reclusos, com efeito, o legislador acertadamente o prescreveu no ordenamento jurídico, objetivando o amparo daqueles que se adequarem aos requisitos exigidos em lei para a sua concessão.
3. CONCLUSÃO
Forçoso então concluir que o auxílio-reclusão, encontra-se devidamente amparado pela Constituição Federal, leis infraconstitucionais, doutrina e jurisprudência pátria.
Como demonstrado, o seu intuito é amparar pessoas em risco social, ou seja, os dependentes de segurados que se encontram no cárcere.
Desse modo, se faz necessária a sua existência, mais ainda por ser um direito assegurado pela Constituição Federal, não ao preso, mas a seus dependentes, como medida de realização de Justiça Social.
REFERÊNCIAS.
CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de direito previdenciário. 12. ed. Florianópolis: Conceito Editorial, 2010;
BRASIL, Goiânia, Lei 8.213, de 24 de julho de 1991, DOU 14/08/1991, Dispõe sobre os planos da Previdência Social e dá outras providências, Disponível em http://www.planalto.gov.br/Ccivil_03/leis/L8213cons.htm – acesso em 15/04/2018;
BRASIL, Goiânia, Constituição Federal, DOU 05/10/1988, Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/ConstituicaoCompilado.htm – acesso em 15/04/2018;
BRASIL, Goiânia, Jurisprudência-Auxílio-Reclusão, Disponível em https://jurisprudencia.trf4.jus.br/pesquisa/resultado_pesquisa.php – acesso em 15/04/2018;
BRASIL, Goiânia, Jurisprudência-Auxílio-Reclusão, Disponível em https://jurisprudencia.trf1.jus.br/pesquisa/resultado_pesquisa.php – acesso em 15/04/2018.
WENDESON COELHO DE JESUS
Cursando o 7º Período de Direito
Faculdade: Fundação Educacional de Goiás-Faclions