Banco deve devolver valores em dobro por não apresentar contrato de empréstimo
O artigo 52 do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/1990) diz que o contrato é nulo se o cliente deixa de receber as informações necessárias para entender corretamente as condições e obrigações que envolvem a contratação de determinado serviço. Por verificar a violação deste dispositivo, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul aceitou Apelação de uma idosa, que teve a Ação Anulatória de negócio financeiro julgada improcedente na primeira instância em Porto Alegre. Com a decisão, ela irá receber em dobro todos os valores pagos indevidamente à financeira.
A autora, que tem 80 anos, se queixou que o Banco Cruzeiro do Sul lhe cobrou juros em percentuais superiores à média praticada pelo mercado financeiro e divulgada pelo Banco Central, além de comissão de permanência. Reclamou que, devido à idade avançada, não se lembra de ter contraído os empréstimos, dos quais não necessita, já que recebe pensão mensal no valor de R$ 25 mil. O contrato foi firmado em 2009 e as parcelas passaram a ser descontadas diretamente de sua aposentadoria.
Para o juiz Oyama de Assis Brasil de Moraes, da 12ª Vara Cível do Foro da Capital, a limitação, tabelamento ou redução de juros por meio de provimento judicial não tem amparo legal, pois as instituições financeiras não se sujeitam às limitações da Lei de Usura (Decreto 22.626/1933). ‘‘Em relação à aplicação dos ditames do Código de Defesa do Consumidor, saliento que não se observa no contrato firmado qualquer violação a esse dispositivo legal a determinar a revisão de qualquer cláusula do pacto’’, justificou na sentença de improcedência.
Vulnerável
A relatora do recurso na 23ª Câmara Cível do TJ-RS, desembargadora Ana Paula Dalbosco, disse que o dever de informação, além de direito do consumidor, é também um dever de cautela do fornecedor de crédito. É que este também deve evitar a causa ou agravamento do próprio prejuízo. ‘‘Trata-se, portanto, de infração a dever anexo imposto pela boa-fé objetiva à oferta de crédito, sem uma análise adequada e minuciosa da possibilidade de cumprimento contratual por parte do consumidor’’.
Segundo apontou a relatora, o banco também não apresentou o contrato firmado com a idosa, embora tenha sido intimado diversas vezes a apresentá-lo em juízo. Assim, na falta do documento, há presunção de veracidade dos fatos narrados na inicial, como prevê o artigo 359 do Código de Processo Civil. Além disso, discorreu no acórdão, a idosa é uma consumidora ‘‘hipervulnerável’’ e merecedora de tutela específica.
A julgadora ressaltou que a autora também é vítima do superendividamento. É que a pensionista idosa possui inúmeros empréstimos bancários (vários contraídos sem necessidade), que, somados, prejudicaram seus vencimentos a ponto de não conseguir mais honrar todas as dívidas. ‘‘Diante da situação específica dos autos — superendividamento e hipervulnerabilidade —, qualquer infração aos ditames da boa-fé objetiva e do estabelecido no ordenamento jurídico pátrio resultará na anulação do negócio do jurídico firmado’’, registrou, reformando totalmente a sentença.