MEU PEDIDO DE BENEFÍCIO FOI INDEFERIDO NA JUSTIÇA, POSSO TENTAR NOVAMENTE?
Essa semana, me deparei com um caso de uma cliente da área previdenciária, onde ano passado, a mesma havia entrado com um processo judicial de requerimento de benefício por incapacidade temporária (auxílio-doença) que foi julgado extinto com resolução do mérito improcedendo o pedido.
Para quem não sabe, quando o juiz indefere um pedido e extingue um processo COM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, torna-se COISA JULGADA. Coisa julgada é a qualidade conferida à sentença judicial contra a qual não cabem mais recursos, tornando-a imutável e indiscutível, que é previsto no artigo 502 do código de processo civil, veja: “Art. 502. Denomina-se coisa julgada material a autoridade que torna imutável e indiscutível a decisão de mérito não mais sujeita a recurso.”
A origem da coisa julgada é atribuída ao direito romano, a chamada “res judicata“. A justificativa de tal instituto à época é muito semelhante à justificativa atual: pacificação social e segurança jurídica.
Uma das finalidades da coisa julgada é imprimir segurança aos julgados, evitando que litígios idênticos sejam novamente ajuizados, o que geraria desordem e discussões infindáveis.
A coisa julgada é uma garantia constitucional e encontra amparo no artigo 5º inciso XXXVI da Constituição da República Federativa do Brasil, conhecida também como Carta Magna, a saber: “A Lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada.”
Porém há exceções, e no caso da minha cliente, se aplica está peculiaridade. Entenda que não há de se falar em coisa julgada, em se tratando de saúde do segurado que pode ser agravada com o tempo, se houver modificação no estado da saúde da pessoa.
Não estamos falando de objeto, ou de coisas, o que é pleiteado na justiça, é algo que muito importante, que é o estado de saúde de uma pessoa que pode sim, mudar de uma hora para outra, ainda mais no caso da minha cliente que com problemas na coluna e como se trata de uma pessoa simples que sempre trabalhou no pesado, o problema dela se agravou em questão de meses.
O novo laudo do perito judicial ficou bem claro onde informa na sua conclusão da perícia judicial e atesta que a autora: ”Apresenta incapacidade total e temporária para o trabalho. Necessita de mais 01 ano de afastamento a partir da data da perícia.”
Veja as exceções que não fazem coisa julgada no código de processo civil:
Art. 504. Não fazem coisa julgada:
I – os motivos, ainda que importantes para determinar o alcance da parte dispositiva da sentença;
II – a verdade dos fatos, estabelecida como fundamento da sentença.
Art. 505. Nenhum juiz decidirá novamente as questões já decididas relativas à mesma lide, salvo:
I – se, tratando-se de relação jurídica de trato continuado, sobreveio modificação no estado de fato ou de direito, caso em que poderá a parte pedir a revisão do que foi estatuído na sentença;
Como visto na própria lei, a nova situação de fato afasta a identidade da causa de pedir. A modificação da causa de pedir, em decorrência do agravamento do estado de saúde do segurado, possibilita nova apreciação da lide, portanto, não há de se falar de coisa julgada.
Veja o entendimento jurisprudencial onde se aplica a exceção de coisa julgada do inciso I, do artigo 502 do Código de Processo Civil:
EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. COISA JULGADA. CLÁUSULA REBUS SIC STANTIBUS. CONCESSÃO DE AUXÍLIO-DOENÇA. CAUSA DE PEDIR DISTINTA. MODIFICAÇÃO DA SITUAÇÃO DE FATO. AGRAVAMENTO DA DOENÇA. OBSERVÂNCIA DOS LIMITES DA COISA JULGADA.
Define-se a coisa julgada como sendo a repetição de ação anteriormente ajuizada já decidida por sentença da qual não cabe mais recurso, cuja similitude se verifica pela presença das mesmas partes, mesma causa de pedir e mesmo pedido. Assim, na hipótese de haver duplicidade de ações, deve prevalecer a sentença que primeiro passou em julgado.
Todavia, não se pode perder de vista que a sentença passada em julgado, em casos tais, quais são as que decidem relação jurídica cujo objeto seja prestação continuada, tem por propriedade a cláusula rebus sic stantibus, de modo que a perenidade da res iudicata perdura enquanto permanecerem a situação de fato e de direito que a ensejaram. Assim, será preciso que estejam presentes a identidade da coisa pedida (actio de eadem re); a identidade do direito donde se origina o pedido (actio ex eadem causa); e, por fim, a identidade das partes (actio inter easdem personas).
A nova situação de fato afasta a identidade da causa de pedir.
A modificação da causa de pedir, em decorrência do agravamento do estado de saúde do segurado, possibilita nova apreciação da lide, porém o benefício não pode retroagir à data do cancelamento administrativo, sob pena de malferir a coisa julgada. O juízo proferido na segunda demanda não pode irradiar efeitos sobre a coisa julgada que se formou na primeira demanda, em razão da imutabilidade da parte dispositiva da sentença que julgou improcedente o pedido de restabelecimento do auxílio-doença.
Deve o julgado ser rescindido parcialmente, para que sejam observados os limites da coisa julgada formado em processo pretérito.
(TRF4, ARS 5024674-70.2021.4.04.0000, TERCEIRA SEÇÃO, Relator MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 08/05/2022).
Veja também:
AÇÃO RESCISÓRIA. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. OFENSA À COISA JULGADA. INOCORRÊNCIA. 1. Em se tratando de benefício previdenciário por incapacidade, a orientação da jurisprudência é no sentido de que a modificação do estado de saúde do segurado faz surgir nova causa de pedir, afastando a tríplice identidade que configura a coisa julgada. 2. Entretanto, a data de início da incapacidade reconhecida na segunda demanda não pode retroagir a momento anterior ao trânsito em julgado da sentença de improcedência exarada na primeira demanda. 3. Ação rescisória julgada parcialmente procedente. (TRF4 5005950-86.2019.4.04.0000, TERCEIRA SEÇÃO, Relator JORGE ANTONIO MAURIQUE, juntado aos autos em 29/07/2019).
Em se tratando de benefício previdenciário por incapacidade, a orientação da jurisprudência é no sentido de que a modificação do estado de saúde do segurado faz surgir nova causa de pedir, afastando a tríplice identidade que configura a coisa julgada.
Se você estiver mais dúvidas sobre está questão que se encaixa no seu caso, consulte um advogado(a) especialista em direito previdenciário para sanar suas dúvidas e te dar uma segurança jurídica.
Dra. Ivenise Rocha.