QUEM DEVE PAGAR O IPTU ATRASADO DE IMÓVEL ARREMATADO EM LEILÃO?

Quem Deve Pagar O Iptu Atrasado De Imovel Arrematado Em Leilao

Ao comprarem (arrematarem) um imóvel em um leilão, nem sempre as pessoas se preocupam com as dívidas que esse bem carrega consigo, especialmente o IPTU, podendo haver uma conta alta perante a Prefeitura Municipal em relação a esse valor.

 

Após a arrematação concluída, surge uma surpresa desagradável, quando o comprador busca registrar a escritura, sendo surpreendido com algumas dezenas de ações de execução fiscal ou com certidão de dívida ativa positivada em relação ao imóvel.

 

Vez ou outra, o valor do débito existente pode até ultrapassar o próprio valor do imóvel, tornando a arrematação sem proveito financeiro.

 

Mas, na realidade, quem deve pagar esses impostos que estão em atraso? Isso é de responsabilidade do arrematante? O que a justiça entende sobre essa situação?

 

Nesse texto, trarei importantes informações a esse respeito.

 

O Imposto Predial e Territorial Urbano – IPTU

 

O IPTU, Imposto Predial e Territorial Urbano, é um imposto decorrente da propriedade de um imóvel urbano, independentemente de qualquer outro motivo.

 

Cada município fixa, através de lei, a sua base de cálculo, valor venal dos imóveis, alíquota, entre outros aspectos em relação a esse imposto.

 

É importante dizer que ele não guarda relação direta com a existência de asfaltamento na rua, coleta de lixo e outros serviços públicos essenciais. Apesar, é claro, que a municipalidade deve cuidar de todos os aspectos para que a cidade funcione de modo adequado.

 

Como dito no início, não é incomum uma pessoa arrematar um imóvel, em leilão, e ele vir com diversas cobranças de IPTU em atraso.

 

Aquisição de imóvel em leilão e responsabilidade pelas dívidas em atraso

 

Quando alguém adquire um imóvel em leilão público, essa aquisição é denominada como originária, isto é, o bem é adquirido sem nenhuma restrição, seja relacionada a dívidas ou restrições de natureza real, como alienação fiduciária, hipoteca e demais garantias que possam existir.

  No caso de tributos, o Código Tributário Nacional, no art. 130, parágrafo único, diz, claramente, que:

 

Art. 130. (…)

 

Parágrafo único. No caso de arrematação em hasta pública, a sub-rogação ocorre sobre o respectivo preço.

Isso significa que, pelo valor que o imóvel foi arrematado, a Fazenda Pública se beneficiaria do valor para quitação dos débitos do imóvel. Caso isso não tenha ocorrido, não é problema do arrematante. Eventuais credores, assim, devem buscar a satisfação de seus créditos junto ao preço obtido na hasta pública realizada, respeitada a ordem de preferência do art. 186 do CTN.

O que a lei deixa claro é que o valor utilizado para a arrematação servirá para o pagamento dos tributos.

 

Segundo Luiz Alberto Gurgel de Faria:

 

Regra interessante consta no parágrafo único, no sentido de que os tributos porventura incidentes nas situações destacadas no caput subrogam-se no lanço ofertado, quando os imóveis são arrematados em hasta pública, demonstrando que nenhuma obrigação será repassada ao arrematante. (Código Tributário Nacional Comentado. 6ª Ed. São Paulo: RT, 2013, p. 690)

 

No mesmo sentido, confira-se a lição de Hugo de Brito Machado:

 

Se o bem imóvel é arrematado em hasta pública, vinculado ficará o respectivo preço. Não o bem. O arrematante não é responsável tributário (CTN, art. 130, parágrafo único). A não ser assim, ninguém arremataria bens em hasta pública, pois estaria sempre sujeito a perder o bem arrematado, não obstante tivesse pago o preço respectivo. Justifica-se o disposto no art. 130 do CTN porque entre o arrematante e o anterior proprietário do bem não se estabelece relação jurídica nenhuma. A propriedade é adquirida pelo arrematante em virtude de ato judicial e não de ato negocial privado. (Curso de Direito Tributário. 22ª Edição. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 134)

 

 Sobre essa questão, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), decidiu que:

 

APELAÇÃO CIVEL – Execução fiscal – Exceção de pré-executividade – IPTU e taxas de serviços públicos – substituição do pólo passivo da ação – Imóvel arrematado em processo falimentar – Execução redirecionada contra a arrematante do bem – ilegitimidade passiva da executada reconhecida de ofício – Possibilidade Matéria de ordem públicaAplicação da regra contida no parágrafo único do art. 130 do CTN Sub-rogação dos créditos tributários sobre o preço da arrematação – Sentença mantida – Recurso improvido. (Apel. nº 692.958-5/2-00, Relator – Des. EUTÁLIO PORTO).

 

Confira-se, ademais, o entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça (STJ):

 

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. TRIBUTÁRIO. ARREMATAÇÃO EM HASTA PÚBLICA. IMPOSSIBILIDADE DE SE IMPOR RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA AO ARREMATANTE EM RELAÇÃO AO PERÍODO ANTERIOR À ARREMATAÇÃO.

 

1. Em se tratando de arrematação em hasta pública, os créditos tributários relativos a tributos incidentes sobre bens imóveis subrogam-se no respectivo preço (art. 130 do CTN), afastada a responsabilidade do arrematante pelos débitos tributários referentes ao período anterior à arrematação. Nesse sentido: REsp 909.254/DF, 2ª Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe de 21.11.2008; REsp 954.176/SC, 2ª Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, DJe de 23.6.2009; AgRg no Ag 1.137.529/SP, 1ª Turma, Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe de 2.2.2010. […] (RMS 27.486/RS, Rel.

 

Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 07/08/2012, DJe 14/08/2012)

 

É claríssimo, portanto, que não cabe ao arrematante arcar com o débito desses impostos em atraso.

 

Entretanto, é importante esclarecer que existe uma exceção para que os débitos anteriores possam ser cobrados do arrematante, que é quando ele está especificado no edital do leilão.

 

A exceção da especificação da dívida no edital do leilão

 

Via de regra, quando o edital do leilão estabelece a existência de algum débito relacionado ao bem, o arrematante deverá arcar com esses valores.

 

Todavia, essa previsão editalícia deve ser precisa, clara e específica, não bastando que conste que “existem débitos de IPTU”, o que inviabilizaria a sua cobrança, conforme foi decidido pela Justiça, a saber:

 

“Apelação – Mandado de Segurança – Arrematação – Imóvel adquirido em hasta pública – Direito assegurado ao arrematante de receber o imóvel isento de tributos lançados anteriormente à arrematação – Exceção à regra que se dá somente no caso de expressa menção no edital quanto à responsabilidade do arrematante pelos débitos tributários – Não é suficiente a expressão genérica de que há débitos de IPTU. O termo ‘a quo’ da responsabilidade é a data da arrematação – Sentença que responsabilizou os arrematantes a partir da data da expedição da carta de arrematação – Impossibilidade – Auto de arrematação que gera efeitos possessórios, independentemente de registro no Cartório Imobiliário – Inteligência do art. 694, do CPC – Tributos devidos antes de tal marco são de responsabilidade do antigo proprietário – Inteligência do parágrafo único do art. 130, do CTN – Sentença reformada em reexame necessário – Recurso parcialmente provido.”

 

(Apelação nº 1032619-45.2016.8.26.0053, j. em 14/09/2017, data de registro: 14/09/2017, g.n.).

 

E, mesmo quando há essa previsão, embora seja específica, há decisões dizendo que a referida cobrança não seria correta.

 

É que, em que pese o artigo 886, VI, do CPC apontar que o edital de hasta pública deverá conter a menção da existência de ônus que recai sobre o bem, o CTN veda expressamente que o arrematante arque com o débito tributário sub judice.

 

A arrematação tem o efeito de extinguir os ônus tributários que incidem sobre o imóvel arrematado. Além disso, o CTN é lei especial em relação ao CPC e sobre ele prepondera.

 

Ademais, é irrelevante a concordância do arrematante tocante às regras contidas no edital, pois as normas de Direito Tributário são imperativas, o que inviabiliza a renúncia (tácita) pelo participante frente à indisponibilidade do direito em questão.

 

O edital – que não tem natureza de lei, mas de oferta pública – vincula-se aos parâmetros previamente estabelecidos em lei, de maneira que, tendo o CTN previsto regra de irresponsabilidade tributária e inexistindo norma do mesmo status que a excepcione, nem mesmo previsão expressa em edital poderia, a rigor, fazê-lo.

 

Desse modo, mesmo que haja essa previsão no edital, de forma específica, há entendimento de que a cobrança é inválida:

 

APELAÇÃO – Ação declaratória de inexistência de relação jurídico-tributária – Débitos de IPTU anteriores à arrematação – Sub-rogação no respectivo preço – Art. 130, parágrafo único, do CTN – Previsão no edital de leilão estabelecendo a responsabilidade do arrematante pelos débitos constituídos sobre o imóvel anteriormente à arrematação – Violação do princípio da legalidade O CTN trata de normas cogentes, de observância obrigatória, não passíveis de revogação pelo edital ou de renúncia pelas partes RECURSO DESPROVIDO.

 

(Apelação nº 1000782-30.2020.8.26.0053).

 

Quem deverá pagar os IPTU’s em atraso

 

O antigo proprietário do bem é que será o responsável pelo pagamento dessa dívida, devendo, o Município, cobrar o referido valor deste.

 

A arrematação não tem o condão de modificar a relação jurídico tributária primitiva, devendo subsistir a responsabilidade do antigo proprietário, conforme jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:

 

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL. IPTU SOBRE IMÓVEL ARREMATADO EM HASTA PÚBLICA. ILEGITIMIDADE PASSIVA. DÉBITOS TRIBUTÁRIOS. SUBROGAÇÃO QUE OCORRE SOBRE O PREÇO. PARÁGRAFO ÚNICO, DO ART. 130, DO CTN. IMPOSSIBILIDADE DE IMPUTAR-SE AO ARREMATANTE ENCARGO OU RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA. OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA PENDENTE, QUE PERSISTE PERANTE O FISCO, DO ANTERIOR PROPRIETÁRIO.

 

1. O crédito fiscal perquirido pelo fisco deve ser abatido do PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO

 

PAULO pagamento, quando do leilão, por isso que, finda a arrematação, não se pode imputar ao adquirente qualquer encargo ou responsabilidade tributária. Precedentes: (Resp 716438/PR, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, julgado em 09/12/2008, DJe 17/12/2008; REsp 707.605 – SP, Relatora Ministra ELIANA CALMON, Segunda Turma, DJ de 22 de março de 2006; REsp 283.251 – AC, Relator Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, Primeira Turma, DJ de 05 de novembro de 2001; REsp 166.975 – SP, Relator Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, Quarta Turma, DJ de 04 de outubro der 1.999).

 

2. Os débitos tributários pendentes sobre o imóvel arrematado, na dicção do art. 130, parágrafo único, do CTN, fazem persistir a obrigação do executado perante o Fisco, posto impossível a transferência do encargo para o arrematante, ante a inexistência de vínculo jurídico com os fatos jurídicos tributários específicos, ou com o sujeito tributário.

 

3. Assim, é que a arrematação em hasta pública tem o efeito de expurgar qualquer ônus obrigacional sobre o imóvel para o arrematante, transferindo-o livremente de qualquer encargo ou responsabilidade tributária.

 

4 Agravo regimental desprovido. (STJ, AgRg no Ag 1246665/SP, Rel. Min. Luiz Fux, DJe 22/04/21010 – grifado).

 

Quando o novo proprietário deve começar a pagar os IPTU’s

 

A responsabilidade do novo proprietário se inicia a partir do ano seguinte ao que foi realizada a imissão na posse do imóvel.

 

Nos termos do art. 903, §3º do CPC, transcorridos 10 (dez) dias da arrematação serão expedidos a carta de arrematação e o mandado de imissão na posse o que encerra a fase judicial do praceamento, incumbindo ao arrematante apresentar a referida carta, enquanto título translativo, ao Cartório de Registro de Imóveis competente para a efetivação do registro tabular, como se extrai dos artigos 182 e seguintes da Lei nº 6.015/73.

 

Sendo assim, possível concluir que a partir da imissão na posse teve início a sujeição passiva por débito próprio da proprietária anterior (arrematante), ainda que com base no vínculo possessório enquanto não formalizada a transferência na matrícula.

 

Nesse sentido, mutatis mutandis, há precedentes da Justiça:

 

Apelação – Ação declaratória – IPTU – Exercícios de 2015 e 2016 – Sentença de improcedência – Pretensão à reforma – Admissibilidade – Autora que adquiriu imóvel em hasta pública oriunda do processo de falência da VASP, com assinatura do auto de arrematação em 27/11/2014 – Expedição da carta da arrematação, com a imissão na posse, que se deu apenas em 11/07/2017, em razão do trâmite falimentar e de invasão do imóvel por terceiros – Controvérsia sobre a sujeição passiva do arrematante entre a lavratura do auto e a imissão na posse, questão sobre a qual há divergência jurisprudencial – O art. 694 do CPC/73, cujo teor foi repetido no art. 903 do CPC/15, dispõe que a assinatura do auto de arrematação a torna irretratável – Além de não se tratar de comando absoluto, já que a arrematação pode ser desconstituída nas hipóteses legais, o objetivo normativo é de dar maior estabilidade ao instituto, e não de prever forma de transmissão de propriedade à margem do sistema registral brasileiro – Assim, ainda que da arrematação surjam efeitos imediatos, como a sub-rogação em contrato locatício, cuja natureza é pessoal (REsp 833.036/RJ), a realização da hasta pública não dispensa o registro na matrícula para a transmissão de propriedade, como exige o art. 1.245 do Código Civil – Questão decidida pelo STJ no REsp 1.045.258/MA, caso envolvendo duas arrematações sobre o mesmo imóvel, tendo prevalecido a segunda arrematação, registrada, sobre a primeira, não registrada – A sujeição passiva do arrematante antes do registro da carta de arrematação advém da posse, que em situações de normalidade ocorre pouco após a lavratura do auto de arrematação – No caso concreto, entretanto, a posse foi obstada pelo trâmite falimentar, havendo também decisão judicial que atribuiu ao administrador judicial a responsabilidade de promover a reintegração da posse do imóvel, que foi invadido após a hasta pública – Arrematante que não logrou obter a posse por motivos alheios à sua vontade – Ademais, em se tratando de falência, prevalece o art. 141, II, da Lei nº 11.101/2005, que prevê os imóveis são alienados sem quaisquer ônus, inclusive tributários – Doutrina que aponta que tal dispositivo buscou deixar mais atrativos os ativos da falida para terceiros – Objetivo que restaria esvaziado com a atribuição das obrigações tributárias a terceiro sem lhe propiciar a correspondente disponibilidade econômica, como a posse – Sentença reformada – Recurso provido.

 

(TJSP; Apelação Cível 1055298-68.2018.8.26.0053; Relator (a): Roberto Martins de Souza; Órgão Julgador: 18ª Câmara de Direito Público; Foro Central – Fazenda Pública/Acidentes – 13ª Vara de Fazenda Pública; Data do Julgamento: 14/09/2020; Data de Registro: 14/09/2020). -grifei-

 

Embora a responsabilidade do novo comprador surja a partir da imissão na posse, caso tenha havido alguma impossibilidade do exercício da posse sobre o imóvel, como a ocorrência de ocupação, manejo de ação possessória ou de usucapião, pendências em relação ao registro da escritura pública, é possível pleitear o não pagamento dos impostos até que essas questões tenham sido resolvidas, quando, enfim, o arrematante poderá exercer a pose sobre o imóvel.

 

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Dr. Rafael Rocha Filho

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