FGTS PODE SER UTILIZADO PARA AMORTIZAR SALDO DEVEDOR DE IMÓVEL FINANCIADO FORA DO SFH
O Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) é uma reserva forçada que o trabalhador com carteira assinada possui, mediante o depósito de 8% (oito por cento) pelo empregador, valor calculado sobre o seu salário, que não pode ser descontado do funcionário.
O rendimento dos depósitos é mínimo, cerca de 3% (três por cento) ao ano e é um instrumento importante para o mercado imobiliário, utilizado para subsidiar financiamento de imóveis, especialmente para população de baixa renda.
O seu uso, pelo assalariado, geralmente está condicionado a imóveis financiados pelo Sistema Financeiro da Habitação (SFH), que é um programa de financiamento habitacional do governo com objetivo de facilitar a aquisição de imóveis residenciais, reforma ou sua construção.
O valor máximo que o imóvel deve ter, para ser incluído nesse programa, é de R$ 1,5 milhão, atualmente. A grande vantagem desse sistema é a limitação de juros remuneratórios, em 12% (doze por cento) ao ano.
Há, também, o Sistema de Financeiro Imobiliário (SFI), que abarca os financiamentos de imóveis que não estão submetidos no SFH, abrangendo imóveis, geralmente, de valores maiores, não havendo limitação de juros para esse sistema de financiamento.
Ainda, existe o sistema denominado de Carteira Hipotecária (CH), de pouco uso e que se destina para imóveis de valores ainda mais elevados, com taxas de juros maiores e que tem como objetivo, na maior parte das vezes, a aquisição de imóveis comerciais e rurais.
A novidade, entretanto, é a possibilidade de utilizar os recursos do FGTS em outros sistemas de financiamento, como o SFI, seja por novas condições editadas pelo Conselho Curador do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (órgão responsável por estabelecer regras acerca do FGTS) bem como por decisões judiciais.
Essa poupança obrigatória que o trabalhador possui pode ser utilizada em algumas ocasiões, como as que estão elencadas nos incisos do art. 20, da Lei de nº 8.036/1990 (que é a lei que regula o FGTS).
Entre as possibilidades, está o uso para: Pagamento de parte das prestações decorrentes de financiamento habitacional concedido no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação (art. 20, inciso V, da Lei 8.036/90). Para esse uso, contudo, são feitas as seguintes exigências:
a) o mutuário conte com o mínimo de 3 (três) anos de trabalho sob o regime do FGTS, na mesma empresa ou em empresas diferentes;
b) o valor bloqueado seja utilizado, no mínimo, durante o prazo de 12 (doze) meses;
c) o valor do abatimento atinja, no máximo, 80 (oitenta) por cento do montante da prestação;
Também é permitido o seu uso para: liquidação ou amortização extraordinária do saldo devedor de financiamento imobiliário, observadas as condições estabelecidas pelo Conselho Curador, dentre elas a de que o financiamento seja concedido no âmbito do SFH e haja interstício mínimo de 2 (dois) anos para cada movimentação (art. 20, inciso VI, da Lei 8.036/90).
De igual forma, para: pagamento total ou parcial do preço de aquisição de moradia própria, ou lote urbanizado de interesse social não construído (art. 20, inciso VII, da Lei 8.036/90).
Nessa modalidade de utilização, será necessário que:
a) o mutuário deverá contar com o mínimo de 3 (três) anos de trabalho sob o regime do FGTS, na mesma empresa ou empresas diferentes;
b) seja a operação financiável nas condições vigentes para o SFH;
Também poderá utilizá-lo para: pagamento total ou parcial do preço de aquisição de imóveis da União inscritos em regime de ocupação ou aforamento (art. 20, inciso XIX, da Lei 8.036/90), devendo observar as seguintes condições:
a) o mutuário deverá contar com o mínimo de três anos de trabalho sob o regime do FGTS, na mesma empresa ou em empresas diferentes
b) seja a operação financiável nas condições vigentes para o Sistema Financeiro da Habitação (SFH) ou ainda por intermédio de parcelamento efetuado pela Secretaria do Patrimônio da União (SPU), mediante a contratação da Caixa Econômica Federal como agente financeiro dos contratos de parcelamento;
c) sejam observadas as demais regras e condições estabelecidas para uso do FGTS.
Essas previsões estão estabelecidas na própria Lei do FGTS, mas duas novas posições, uma do Conselho Curador e outra da Justiça, trouxeram importantes inovações acerca da possibilidade do uso do FGTS no mercado imobiliário.
Resolução CCFGTS nº 994/2021 – Uso do FGTS para pagamento total ou parcial de imóveis financiados fora do SFH
A primeira dessas novidades foi a edição, em 11 de maio de 2021, pelo Conselho Curador do FGTS, da Resolução CCFGTS nº 994/2021.
Essa resolução passou a permitir a utilização dos recursos do FGTS para liquidação ou amortização do saldo devedor e do pagamento de parte das prestações de financiamentos habitacional fora do âmbito do SFH, veja:
Art. 10. A movimentação da conta vinculada do FGTS para liquidação ou amortização extraordinária de saldo devedor e pagamento de parte do valor das prestações de financiamento habitacional concedido por Agente Financeiro do SFH, assim classificado na forma estabelecida pelo CMN, dentro ou fora do âmbito do SFH, obedecerá aos critérios definidos neste artigo, além daqueles estabelecidos em Lei.
A utilização desse recurso dependerá que o valor de avaliação do imóvel objeto do financiamento esteja dentro do limite estabelecido para o SFH, conforme constante na Resolução CMN (Conselho Monetário Nacional).
Para o uso do FGTS em financiamentos feitos fora do SFH, como, por exemplo, no SFI, é necessário, entretanto, seguir as previsões desta resolução, especialmente:
§ 1º O titular da conta do FGTS deverá contar com o mínimo de 3 (três) anos de trabalho sob o regime do FGTS na mesma empresa ou em empresas diferentes.
§ 2º É permitida a movimentação da conta vinculada ao seu titular que, na data em que esta vier a ocorrer:
I – não seja detentor de financiamento no âmbito do SFH em qualquer parte do território nacional; e
II – não seja proprietário, possuidor, promitente comprador, usufrutuário ou cessionário de outro imóvel residencial, concluído ou em construção no município de residência do titular da conta FGTS ou no local onde este exerce a sua ocupação laboral principal, incluindo os municípios limítrofes ou da mesma região metropolitana.
Para liquidação ou amortização extraordinária, cada movimentação deverá aguardar o prazo mínimo de 2 (dois) anos, como prevê o § 5º, do art. 10, da resolução.
Você pode usar o FGTS para diminuir em até 80% (oitenta por cento) o valor das prestações em 12 (doze) meses consecutivos (art. 11, inciso I, da resolução), algo que também dependerá que o valor de avaliação do imóvel objeto do financiamento esteja dentro do limite estabelecido para o SFH, conforme constante na Resolução CMN.
A Caixa Econômica Federal, porém, só permite o uso do FGTS para esses contratos que foram firmados a partir de 12/06/2021.
Decisões judiciais, entretanto, permitem o uso do FGTS para contratos que foram celebrados antes desta data e da própria edição da resolução comentada.
Decisões judiciais permitem a utilização do FGTS para quitação de débitos de imóveis fora do SFH
Há decisões judiciais permitindo o uso do FGTS para quitação integral ou amortização parcial de financiamentos para aquisição de imóveis ou reformas, inclusive feitos fora do SFH, para contratos realizados em qualquer época.
O entendimento é de que as hipóteses previstas no art. 20, da Lei n. 8.036/80, são apenas exemplos de formas pelas quais o FGTS poderia ser utilizado, não excluindo outras, conforme posição do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (Rio Grande do Sul):
EMENTA: ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. LEVANTAMENTO FGTS. AMORTIZAÇÃO FINANCIAMENTO HABITACIONAL. ROL DO ART. 20 DA LEI 8.036/90. EXEMPLIFICATIVO. (IM)POSSIBILIDADE DE LIBERAÇÃO DE SALDO. O entendimento do STJ e deste Tribunal se inclina no sentido de que o rol de possibilidades de utilização do FGTS exposto no art. 20, da Lei nº 8.036/90 é meramente exemplificativo, sendo admitidas outras situações que caracterizem a finalidade social da norma, possibilitando o levantamento do saldo da conta vinculada do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) para quitação de financiamento habitacional de casa própria, ainda que à margem do Sistema Financeiro da Habitação (TRF4, AC 5001121- 74.2016.4.04.7111, QUARTA TURMA, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, juntado aos autos em 05/08/2021)
EMENTA: ADMINISTRATIVO. FGTS. SALDO DA CONTA VINCULADA. LIBERAÇÃO. AMORTIZAÇÃO DE SALDO DEVEDOR DE FINANCIAMENTO HABITACIONAL FORA DO SFH. POSSIBILIDADE. SENTENÇA MANTIDA. APELAÇÃO NÃO PROVIDA. (TRF4, AC 5038592-21.2020.4.04.7100, QUARTA TURMA, Relator CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR, juntado aos autos em 10/06/2021)
EMENTA: CIVIL. CONTRATOS BANCÁRIOS. MÚTUO HABITACIONAL. AÇÃO DE PROCEDIMENTO COMUM. FGTS. PEDIDO REVISIONAL GENÉRICO. LIBERAÇÃO. AMORTIZAÇÃO DE FINANCIAMENTO HABITACIONAL FORA DO SFH. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. O Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp nº 1.061.530/RS, sob o rito dos recursos repetitivos, já decidiu que é vedado aos juízes de primeiro e segundo graus de jurisdição julgar, com fundamento no art. 51 do CDC, sem pedido expresso, a abusividade de cláusulas nos contratos bancários. É possível o levantamento do saldo da conta vinculada do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) para quitação de financiamento habitacional de casa própria, ainda que à margem do Sistema Financeiro da Habitação, segundo interpretação finalística da norma contida no art. 20 da Lei 8.036/90. Precedentes do STJ e deste Tribunal. (TRF4, AC 5000624-55.2019.4.04.7208, QUARTA TURMA, Relator SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA, juntado aos autos em 23/04/2021)
Há decisões exigindo, porém, que todos os requisitos para que o imóvel pudesse ter sido financiado pelo SFH, à época de aquisição do bem, estivessem presentes, sob pena desse pedido ser indeferido:
DIREITO CIVIL. PROCESSO CIVIL. SISTEMA FINANCEIRO DE HABITAÇÃO (SFH). CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE. REGULARIDADE DO PROCEDIMENTO DE EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL. DA POSSIBILIDADE DE LEVANTAMENTO DO FGTS PARA AMORTIZAÇÃO DO SALDO DEVEDOR. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA.
(…)
7. O Decreto Regulamentador n.º 99.684, de 8 de novembro de 1990, em seu art. 35, inc. VII, letra b, autoriza que o saldo da conta vinculada ao FGTS possa ser utilizado no pagamento total ou parcial do preço de aquisição de moradia própria.
8. Vê-se, pois, que há expressa autorização legal para que o trabalhador possa levantar os recursos da conta vinculada ao FGTS visando sua utilização na aquisição de moradia própria, ainda que fora do SFH, desde que preenchido os requisitos para utilização dos recursos existentes para o financiamento do imóvel pelo SFH, como no caso dos autos.
9. Apelação parcialmente provida.
(AC 1000184-03.2017.4.01.3807, DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS AUGUSTO PIRES BRANDÃO, TRF1 – QUINTA TURMA, PJe 07/04/2021 PAG.).
LEVANTAMENTO DE SALDO DE CONTA VINCULADA AO FGTS. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO (SFH). AMORTIZAÇÃO DO SALDO DEVEDOR. CONDIÇÕES VIGENTES PARA O SFH. VALOR DO IMÓVEL FINANCIADO EXCEDIA O LIMITE PARA ENQUADRAMENTO DA OPERAÇÃO NO SFH. SENTENÇA MANTIDA
1. Trata-se de ação ordinária objetivando a liberação do valor depositado na conta vinculada ao FGTS do autor, para amortização do saldo devedor do financiamento de imóvel.
2. De acordo com jurisprudência deste Tribunal, é autorizada a utilização do saldo de FGTS para pagamento de financiamentos efetivados fora do Sistema Financeiro da Habitação, desde que atendidos os requisitos das alíneas a e b do inciso VII do art. 20 da Lei n. 8.036/90, que prevê a movimentação da conta para pagamento total ou parcial do preço de aquisição de moradia própria, ou lote urbanizado de interesse social não construído, observadas as seguintes condições: a) o mutuário deverá contar com o mínimo de 3 (três) anos de trabalho sob o regime do FGTS, na mesma empresa ou empresas diferentes; b) seja a operação financiável nas condições vigentes para o SFH” (TRF1, REO 1004097-84.2016.4.01.3400, Rel. Desembargador Federal Carlos Moreira Alves, 5T, e-DJF1 19/05/2019).
3. O rol presente no art. 20, da Lei nº 8.036/90, não é exaustivo, sendo assim possível o levantamento dos valores depositados na conta fundiária para fins de amortização ou quitação de contrato de financiamento habitacional não submetido ao SFH, desde que atendidos os mesmos requisitos para liberação nos contratos vinculados a esse sistema. 2. Inviabilização da movimentação da conta quando o valor do imóvel ultrapassar o teto definido pelo BACEN para financiamento pelo SFH (TRF1, AMS 0044086-83.2013.4.01.3800, Rel. Desembargadora Federal Daniele Maranhão Costa, 5T, e-DJF1 06/07/2018).
4. Conforme consignado na sentença, nos termos da Resolução do CMN 4.271/12, de 30/09/13 a 23/11/2016, o valor máximo do imóvel para financiamento pelas regras do Sistema Financeiro da Habitação era de R$ 650.000,00 – valor este bem inferior àquele da compra e venda efetuada, qual seja, R$1.160.000,00 (fls. 145-146).
5. Demonstrado, portanto, que, na época do financiamento, o valor do imóvel financiado excedia o limite para enquadramento da operação no SFH, circunstância que impede a liberação do saldo do FGTS.
(AC 0011960-65.2017.4.01.3500, DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO BATISTA MOREIRA, TRF1 – SEXTA TURMA, PJe 16/12/2020 PAG.)
O Superior Tribunal de Justiça (STJ), também permite a liberação do FGTS para uso fora do SFH, contudo, exige que o imóvel, quando foi adquirido, tivesse atendido as mesmas exigências para aqueles financiados no sistema do SFH, especialmente a faixa de preço, que deve ser àquela da data da aquisição, não importando que, posteriormente, o valor limite pelo SFH tenha aumentado e atingido o valor do imóvel, a saber:
RECURSO ESPECIAL Nº 1938084 – PE (2021/0144998-8)
DECISÃO
(…)
1. A quaestio iuris gira em torno da verificação das hipóteses de levantamento de valores depositados em conta vinculada ao FGTS, de acordo com o art. 20 da Lei n. 8.036/90. A Caixa Econômica Federal alega que é incabível a utilização de saldo do FGTS para pagamento de reforma de imóvel não financiado pelo Sistema Financeiro de Habitação, já que o rol de hipóteses de saque estaria previsto em numerus clausus.
2. Entretanto, o Superior Tribunal de Justiça já assentou que o art. 20 da Lei n. 8.036/90 apresenta rol exemplificativo, por entender que não se poderia exigir do legislador a previsão de todas as situações fáticas ensejadoras de proteção ao trabalhador, mediante a autorização para levantar o saldo de FGTS. Precedentes. partindo dessa premissa, dois outros pontos devem ser resolvidos in casu.
(…)
In casu, o imóvel em questão não foi financiado pelo SFH pois seu valor superava o teto estipulado deixando, portanto, de preencher todos os requisitos do Sistema Financeiro de Habitação. Por tal motivo, em consonância com o entendimento desta Corte, o saldo da conta FGTS não pode ser movimentado conforme pretendido pelos recorrentes.
(Ministro FRANCISCO FALCÃO, 04/08/2021).
Desse modo, mesmo que o seu imóvel tenha sido adquirido antes da edição da resolução CCFGTS nº 994/2021, será de suma importância verificar se as condições pelas quais ele foi financiado se enquadraria nas mesmas exigidas pelo SFH, especialmente a faixa de preço, à época da aquisição, para sucesso em eventual ação judicial.
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Dr. Rafael Rocha Filho