A nulidade no processo arbitral que pode reverter a rescisão por inadimplência do seu contrato de compra de imóvel
Deixar de pagar as parcelas do seu contrato é o pior caminho que você pode tomar para conseguir a rescisão/fim do seu contrato. Eu falei sobre isso em alguns outros textos.
Isso é ruim porque faz com que você sofra com a aplicação de multa, juros e descontos de outros encargos e penalidades, além de poder ter o seu nome inscrito nos órgãos de proteção ao crédito (negativação).
Existe, porém, uma situação que é ainda muito pior, que é quando uma pessoa adquire um terreno e constrói uma casa nele, deixando de pagar as parcelas do lote comprado.
Embora que, na rescisão desse contrato, a construção feita (acessão) deva ser indenizada, em muitas ocasiões, sequer se sabe da existência dessa construção que foi feita, passando batido isso no processo, fazendo com que o comprador não seja indenizado pela obra que foi realizada.
Ou seja, perde o terreno e a casa.
E esse é um dos piores cenários que eu já vi.
Pessoas que deixaram de pagar as prestações do contrato do terreno – não quero adentrar ao mérito dessa inadimplência, porque sabemos que a vida pode reservar situações muito difíceis para cada um – e acabaram perdendo o terreno e a própria casa que foi construída, recebendo uma restituição irrisória pelas parcelas pagas.
Ocorre que, em muitos desses contratos, há a previsão de uma cláusula diferente, a cláusula compromissória, que prevê a utilização da arbitragem para a solução de qualquer problema jurídico que surja daquele contrato.
E é a existência dessa cláusula e mais alguns fatores que podem resultar na nulidade e te salvar de perder o seu terreno e, consequentemente, da casa que você construiu nele.
O que é a cláusula compromissória?
A cláusula compromissória é um dispositivo incluído no contrato para que, caso surja a necessidade de que um terceiro decida sobre alguma questão do contrato que as partes não concordam, em vez de se utilizar o Poder Judiciário, que seria o caminho natural, um arbitro ou Corte Arbitral sejam escolhidos de ante mão para a solução do conflito.
Isso não significa que será tentado resolver o problema com o árbitro e, não concordando, o processo irá para a Justiça decidir. O árbitro decidirá com uma certa soberania e aquela decisão proferida por ele não poderá ser alterada pela Justiça.
Então, preste atenção antes de assinar o seu contrato para que você não apenas o leia, mas compreenda o que está escrito, entendendo as consequências daqueles termos. Procure um advogado especialista no assunto para te orientar.
Em relação a essa cláusula há um detalhe: ela é facultativa ao consumidor. Havendo uma relação de consumo, isto é, quando existe um fornecedor de um lado, um consumidor do outro e há a comercialização de um produto ou serviço, a utilização da via arbitral é faculdade do consumidor.
Veja:
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL E RECURSO ADESIVO. RESCISÃO CONTRATUAL C/C DEVOLUÇÃO DE VALORES C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS C/C PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA. CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA. CONTRATO DE ADESÃO. FACULDADE DO CONSUMIDOR. LEGITIMIDADE PASSIVA. TEORIA DA ASSERÇÃO. RESPONSABILIDADE PELO DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL. TEORIA DA APARÊNCIA. PRESCRIÇÃO PARA RESTITUIÇÃO DE COMISSÃO DE CORRETAGEM. RECONHECIDA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CABÍVEL.
1. Inviável o reconhecimento da eficácia da cláusula compromissória fixando a arbitragem como forma de solução dos litígios dele derivado, quando há propositura da ação originária pelos autores/apelados/recorrentes, demonstrando o desinteresse na instauração da referida via alternativa de resolução do conflito.
(…)
APELAÇÃO CÍVEL PARCIALMENTE PROVIDA E RECURSO ADESIVO PROVIDO.
(TJGO, APELACAO 0274941-18.2016.8.09.0173, Rel. Des(a). JAIRO FERREIRA JUNIOR, 6ª Câmara Cível, julgado em 27/06/2020, DJe de 27/06/2020)
Na maior parte das vezes, a comercialização de um imóvel é uma relação de consumo, principalmente quando existe uma incorporadora, imobiliária ou construtora figurando como vendedora.
E, pelo fato de ser faculdade de o consumidor optar pela sua utilização ou não, a sua imposição obrigatória pode resultar em nulidade, nos termos do art. 51, inciso VII, do Código de Defesa do Consumidor.
Mas, cuidado!
Não é pelo fato da utilização compulsória dessa cláusula que, invariavelmente, haverá a nulidade do processo de rescisão. É importante você entender alguns detalhes.
A nulidade do processo arbitral que pode impedir a rescisão do seu contrato de compra e venda
Conforme falado anteriormente e explicado a você, a cláusula compromissória, mesmo que prevista e incluída no contrato, cumprindo todos os requisitos legais, é uma faculdade do consumidor.
Vamos entender, agora, de forma resumida, como ocorre um processo na Corte Arbitral e como essa nulidade poderia ser alegada.
A Lei de nº 9.307/96, que trata sobre a arbitragem, possui uma série de regras e o processo que lá se origina é bastante semelhante com uma ação judicial comum.
É necessário que haja a citação da parte contrária, oportunizado prazo para apresentação de sua defesa, produção de provas e, ao fim, prolação da sentença arbitral.
Em muitos desses processos movidos por empresas do ramo imobiliário perante as Cortes, a citação do consumidor é feita de forma ficta, isto é, sem que ele realmente tenha sido notificado, geralmente, essa citação é feita por edital, pelo fato de não ter sido encontrado o consumidor.
Assim, não se sabe ao certo se o consumidor queria ou não que o processo corresse na Corte e sem essa manifestação clara, visto que a presunção é de sua recursa, o Judiciário tem entendido pela nulidade do processo arbitral, conforme você pode verificar:
APELAÇÃO CÍVEL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA ARBITRAL. DECADÊNCIA DO DIREITO DE REQUERER NULIDADES. POSSIBILIDADE DE DISCUSSÃO EM SEDE DE IMPUGNAÇÃO AO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. APLICAÇÃO DO § 3º DO ART. 33 DA LEI 9.307/96. NULIDADE DA CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA. INEXEQUIBILIDADE DO TÍTULO EXECUTIVO JUDICIAL.
1. A falta ou nulidade da citação encontra previsão no § 1º do artigo 525 do Código de Processo Civil, sendo passível de ser arguida em sede de impugnação ao cumprimento de sentença arbitral ou mesmo em exceção de pré-executividade, ainda que ultrapassado o prazo decadencial de 90 (noventa) dias (§ 3º artigo 31 Lei de Arbitragem).
2. Consoante o teor na Súmula 45 desta Corte Estadual de Justiça, por se tratar de relação de consumo, considera-se nula de pleno direito a cláusula que determina a utilização compulsória de arbitragem, ainda que satisfeitos os requisitos do artigo 4º, §2º, da Lei nº 9.307/96, face a presunção de recusa da arbitragem pelo consumidor. RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDO E DESPROVIDO.
(TJGO, PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Recursos -> Apelação Cível 5314017-39.2016.8.09.0051, Rel. Des(a). ANDERSON MÁXIMO DE HOLANDA, 3ª Câmara Cível, julgado em 22/03/2021, DJe de 22/03/2021)
Dessa forma, caso o processo na Corte Arbitral tenha corrido sem que o consumidor tenha manifestado a sua concordância com a instituição da arbitragem, especialmente quando citado por edital ou outro meio ficto, será viável o questionamento de todo o processo, no Judiciário.
É preciso, ainda, fazer uma ressalva: caso o consumidor tenha sido citado pessoalmente, comparecido na Corte Arbitral e, em alguns casos, até tenha apresentado a sua defesa, não poderá, posteriormente, dizer que não queria que o processo caminhasse naquele local.
Isso deve ser feito na primeira oportunidade que tiver para falar na Corte, sob pena de aceitar que a ação seja processada e julgada lá.
Você não pode “aceitar” o processo e, depois, dizer que ele é nulo porque a cláusula compromissória instituiu a arbitragem compulsoriamente.
É necessário que isso seja dito no processo, que você não concorde com ele, porque, embora a utilização da cláusula compromissória, na relação de consumo, seja nula, o consumidor pode optar pelo seu uso, fazendo com que o processo seja considerado como válido.
Efeitos da declaração de nulidade do processo arbitral
Conseguindo a decisão judicial que reconheça a nulidade do processo arbitral, ante o motivo apresentado nesse texto, haverá o retorno das partes ao estado anterior ao processo.
Isso significa que o processo arbitral nulo, que determinou a rescisão do contrato, não terá nenhum efeito. É como se ele não existisse.
A empresa não poderá retomar o imóvel com base naquela sentença e o comprador ainda terá tempo de se organizar financeiramente para poder realizar o pagamento de seus débitos.
É importante deixar claro que a nulidade do processo arbitral não resulta em quitação, declaração de inexistência da dívida, perdão desta ou qualquer outra coisa nesse sentido.
Recado muito importante: não deixe, então, que as coisas corram “frouxas”, achando que não darão em nada ou que aquele “papel” que você recebeu não tem importância. É de extrema necessidade que você seja diligente com esses assuntos.
Embora haja a possibilidade de se alegar essa nulidade, pelo motivo aqui explicado, nem sempre as circunstâncias do caso permitem isso. Além do mais, deixar o processo chegar nessa situação irá trazer desgastes em todos os sentidos. Melhor resolver a celeuma o quanto antes.
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Dr. Rafael Rocha Filho