Condução Coercitiva De Réu Ou Investigado Para Interrogatório É Inconstitucional

Conducao Coercitiva De Reu Ou Investigado Para Interrogatorio E Inconstitucional

De madrugada a polícia federal junto com o carro da rede globo está tocando a campainha de um famoso para conduzi-lo coercitivamente para a delegacia para ser interrogado.

 

Claro, conduzido pelo premiado galã das telas da PF, o japonês da Federal.

 

Detalhe, a pessoa jamais foi intimada, convidada, convocada para comparecer a tal local.

 

Viu-se muito essa prática lavajatista acontecer, inclusive com o ex-presidente Lula.

 

Espetáculo não faltou, faltou mesmo foi aplicação da constituição.

 

Sobrou também o uso da condução coercitiva como meio de intimidação de investigado e em um ato de enlamear a imagem do imputado como se culpado fosse para os meios de comunicação, não necessitando sequer de processo.

 

Um horror é o que se pode dizer que se tornou a investigação criminal no Brasil, principalmente da forma que foi conduzida pelo “Supremo Tribunal Federal de Curitiba”, pelo seu Ministro Mor Moro.

 

Nesse texto vou comentar brevemente sobre a decisão do STF no julgamento das Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPFs) 395 e 444, que questionou a constitucionalidade do art. 260 do Código de Processo Penal, que diz:

 

Art. 260.  Se o acusado não atender à intimação para o interrogatório, reconhecimento ou qualquer outro ato que, sem ele, não possa ser realizado, a autoridade poderá mandar conduzi-lo à sua presença.

 

Segundo a Corte o art. 260 do Código de Processo Penal não foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988.

 

O emprego da medida, segundo o entendimento majoritário, representa restrição à liberdade de locomoção e viola a presunção de não culpabilidade, sendo, portanto, incompatível com a Constituição Federal.

 

Entendeu o Supremo que a condução coercitiva representa uma supressão absoluta, ainda que temporária, da liberdade de locomoção.

 

Alguns preceitos constitucionais e fundamentais que podem ser vistos nessa decisão são: Presunção de não culpabilidade, Dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF/88), Liberdade de locomoção, Potencial violação ao direito à não autoincriminação, Potencial violação à presunção de não culpabilidade.

 

Tecerei alguns comentários sobre essa decisão para esclarecer sobre como deve ser o procedimento a partir do momento que seus efeitos jurídicos começaram a existir, e o que ocorre quando for descumprida tal decisão.

 

Acompanhe comigo e saiba o que é a inconstitucionalidade da condução coercitiva e quais são seus efeitos se praticada.

 

1. Testemunhas e peritos não entram nessa decisão.

 

As testemunhas são obrigadas a depor, e não tem direito ao silêncio, veja o que diz o artigo 342 do Código Penal:

 

Art. 342. Fazer afirmação falsa, ou negar ou calar a verdade como testemunha, perito, contador, tradutor ou intérprete em processo judicial, ou administrativo, inquérito policial, ou em juízo arbitral:

 

Pena – reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.

 

É o chamado crime de falso testemunho ou falsa perícia.

 

A decisão em comento abrange réu ou investigado, os outros atores do processo penal não sofreram qualquer mudança, com a novel decisão.

 

Na verdade, e já adianto, essa é uma forma de acabar com a espetacularização de operações, principalmente as que estavam envolvidas na operação lavajato que foi uma das maiores e mais assistidas telenovelas do Brasil.

 

Todo dia um novo capítulo e o jornal nacional anunciava cenas dos próximos que estavam por vir.

 

Dessa forma uma testemunha ou perito que regularmente intimado a comparecer e não apresenta justificativa prévia de sua ausência, pode ser conduzido coercitivamente.

 

2. Há alguma possibilidade de ser o réu ou investigado conduzido coercitivamente?

 

A resposta é sim, existe.

 

Em primeiro lugar é importante observar que o que não foi recepcionado pela constituição Federal de 1988, não foi todo o artigo 260 do Código de Processo Penal, mas a expressão; “para interrogatório”.

 

Há outros atos, conquanto haja divergência, pois são autoincriminantes, tais como reconhecimento, que o réu ou investigado é obrigado a participar, mesmo que de forma passiva.

 

Em segundo lugar, há ainda a possibilidade do comparecimento do réu ou investigado ser uma medida em substituição a cautelar mais grave, como prisão preventiva, nesse caso, ele é obrigado a comparecer para que evite-se a decretação da prisão.

 

Em qualquer dos casos está garantido o direito ao silêncio, bem como a qualquer repulsa a atos que o autoincriminem.

 

3. Mas e se a autoridade descumprir e me conduzir coercitivamente?

 

Nesse caso o próprio acórdão já fez a previsão do que deve ocorrer quando a autoridade policial extrapolar seus parâmetros legais.

 

“sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade”

 

O agente ou autoridade que descumprir a decisão emanada pela Suprema corte responderá nos âmbitos disciplinar de seu órgão corregedor bem como civilmente em reparação de danos causados à imagem do conduzido, e ainda criminalmente com o abuso de autoridade.

 

4. As Provas obtidas por esse meio ilícito são nulas.

 

Impende ainda ressaltar que as provas obtidas de forma ilícita, geradas em uma condução coercitiva ilegal, devem ser declaradas nulas, desentranhadas do processo, e em minha opinião deve ser substituído o juiz (a) que as conheceu, pois está contaminado.

 

Lembro ainda que no mesmo acórdão, não houve modulação de efeitos, ou seja, essa decisão não vale para atos anteriores, em que pese fundamentada discussão, pois em benefício, no âmbito penal devem retroagir a Lei e decisões importantes como essa.

 

São esses os breves comentários que tenho a fazer sobre essa decisão, e espero que traga luz a quem é investigado ou réu em ação penal.

 

E você o que achou? Compartilhe nos comentários.

 

Envie esse texto para alguém que precise dessa informação.

 

Em todo caso, consulte sempre um advogado.

 

Abaixo segue o acórdão da decisão comentada.

 

A C Ó R D Ã O

 

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, sob a presidência da Senhora Ministra Cármen Lúcia, na conformidade da ata de julgamento e das notas taquigráficas, por maioria e nos termos do voto do Relator, julgar procedente a arguição de descumprimento de preceito fundamental, para pronunciar a não recepção da expressão “para o interrogatório”, constante do art. 260 do CPP, e declarar a incompatibilidade com a Constituição Federal da condução coercitiva de investigados ou de réus para interrogatório, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de ilicitude das provas obtidas, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado. Destacam, ainda, que esta decisão não desconstitui interrogatórios realizados até a data do presente julgamento, mesmo que os interrogados tenham sido coercitivamente conduzidos para tal ato.

 

Dr. Rafael Rocha

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